por Sulamita Esteliam

Minha amiga virtual Bernadete Lage, de Viçosa/MG, me envia um bilhete, por correio eletrônico, acerca da proposta que ela levou à plenária governamental Políticas Públicas para o Povo da Cultura Cigana, que aconteceu no Rio de Janeiro, no último 25 de maio, e que este blogue anunciou – aqui.

Guerreira incansável, Bernardete se prepara para armar barraca no Território das Mulheres na Cúpula dos Povos, que começa dia 15, no Aterro do Flamengo; vai batalhar pela causa. E certamente, terá apoio das feministas e ativistas de direitos humanos e da comunicação no pedaço –aqui e aqui neste blogue .
Eis o bilhete:
E eis a proposta:
Principais problemas enfrentados por 90% da população cigana no país, que são os nômades:
– ANALFABETISMO
– EXCLUSÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS.
– FALTA DE ESPAÇOS, COM INFRA-ESTRUTURA, DESTINADOS A ELES.
– CONSTANTES AGRESSÕES MORAIS E FÍSICAS.
– CERCEAMENTO DO DIREITO DE IR E VIR.
Em contato, há anos com grupos de ciganos espalhados pelo país – os nômades e que são 90% da etnia, segundo o IBGE, descobrimos que seus principais problemas são a falta de acesso políticas públicas (saúde, escola, etc), exclusão social, agressões e cerceamento do direito de ir e vir, e que estão, diretamente, ligados ao efeitos dos comportamentos preconceituosos da sociedade, como passamos a relatar.
Efeitos Deletérios do Preconceito
1) CRIANÇAS NA ESCOLA
Os ciganos têm, geralmente, permissão para ficar no máximo 60 dias em cada cidade. Assim que conseguem o espaço, em terreno particular alugado ou da prefeitura, pessoas da circunvizinhança, amedrontadas, passam a pressionar as autoridades para que seja efetuada a retirada dos mesmos, às vezes, antes mesmo de matricularem suas crianças nas escolas. Há casos de expulsão em até três dias depois de instalados. O processo de transferência escolar requer uma logística impensável. Precisam ir à nova escola, solicitar a vaga, pagar a taxa da Caixa Escolar e voltar à antiga cidade para pegar a transferência. Isso demanda dinheiro para a locomoção, tempo para a emissão do documento e boa vontade dos funcionários.
A maioria dos pais, analfabetos, não têm carteira de habilitação e gastam dinheiro com caminhões em cada mudança que fazem. Quando conseguem ficar um tempo maior, as crianças precisam de um prazo para se adaptar à nova sala de aula, o que se tornaria mais fácil e rápido se OS ALUNOS E PROFESSORES LOCAIS ESTIVESSEM PREPARADAS PARA AS RECEBEREM COMO IGUAIS, COM ACOLHIMENTO FRATERNO E DESARMADO. A exclusão desumana, compromete o rendimento dessas crianças que vivem sob o estresse de mudanças constantes e a rejeicao.
D. Ines Cordeiro, a Pedagoga que dedicou que dedicou sua vida aampando com ciganos, alfabetizando crianças a troco de alimentacao, nos contou que ja foi expulsa com eles tres vezes num mesmo dia. Queremos registrar que ouvimos muitos ciganos, em locais diferentes, confidenciarem que sonham com um espaço onde possam ficar permanentemente com suas famílias com segurança, escola e atendimento médico, sem a eterna inseguranca. Daí, podemos concluir que eles, em sua maioria, se configuram o que chamamos de NÔMADES COMPULSÓRIOS.
2) ATENDIMENTO MÉDICO
Todo paciente, ao ser atendido em uma instituição pública de saúde, necessita fornecer endereço. (D. Gislene, cadeira de rodas, problemas com o sedentarismo, tentado para ser atendida pelo SUS). Como os ciganos têm que mudar constantemente, eles poderiam ter a vida facilitada, a partir de agora, pelo o uso do Cartão Identificador do SUS, (é esse o nome?) com um endereço único, no ato da inscrição.
Um dos relatos frequentes deles sobre o atendimento médico é o desprezo, medo ou rejeição dos funcionários que dificultam a presteza ou efetivação do atendimento. O único tratamento odontológico a que têm acesso continua a ser a blindagem dos dentes com ouro, junto com hábito da escovação que algumas crianças aprendem nas escolas.
3) ESPAÇOS DEFINIDOS E INFRAESTRUTURA
A partida de um grupo de ciganos de uma cidade se assemelha a uma saída de refugiados. Quando não têm tempo de achar outra cidade e precisam cumprir a ordem de desocupação da área, enquanto aguardam alguns membros do grupo conseguirem uma cidade que os acolha, as famílias pernoitam nas estradas, sem água, luz, em condições insalubres. Já os visitamos em uma ocasião dessas e, podemos afiançar, não há nada mais desolador.
A sugestão é de que se criar espaços com pontos de luz, banheiros, e mesmo cozinha, aliás, como já foi feito em alguns locais e que esbarrou no acabamento imprescindível: a aceitação deles pela comunidade local.
Senhores Representantes:
Confiamos plenamente em nosso governo, que vem, ao longo dos anos, se mostrando sinceramente comprometido com a erradicação da pobreza e com o progresso das famílias de baixa renda. Os resultados são claramente percebidos em nosso país. Temos certeza de que farão tudo para conseguir solução urgente para a inclusão da etnia cigana.
Não se trata, em nenhuma hipótese, de interferência na cultura e saberes de uma etnia. Tratamos, tão somente, de coisas práticas, vitais para a sobrevivência, como a alfabetização, acesso à saúde e respeito, sem os quais, se torna inviável o dia a dia de qualquer ser humano, vivido com dignidade.
NOSSO ALERTA: Pelo acima exposto, fica claro que de nada adiantarão políticas públicas se não for, deflagrada, concomitantemente, uma CAMPANHA NACIONAL POR RESPEITO E ACOLHIMENTO AO POVO CIGANO, mostrando a todos que essas pessoas (crianças, adultos, idosos), que sofrem diariamente com o preconceito, são absolutamente iguais a todos na sociedade civil, com os mesmos problemas, sonhos e necessidades. E que têm direito ao mesmo tratamento em nosso país, brasileiros que são.
Deixamos claro que, mesmo os 10% da etnia, que são sedentários e que conseguem acesso à educação e saúde de qualidade e que exercem profissões que contribuem para o desenvolvimento do nosso país, também sofrem com o preconceito, muitos deles procurando omitir sua etnia, para evitar aborrecimentos. Além do peso da dor da luta constante em prol daqueles que não tiveram a mesma sorte. Todos querem ajudar!
Por fim, a boa notícia, que fazemos questão de registrar: a esmagadora maioria da população brasileira à qual expusemos os problemas da etnia cigana, confessou o preconceito arraigado desde a infância e foi absolutamente solidária com a causa. TODOS passaram a querer ajudar. E tem sido emocionante!
Professores, donas de casa, blogueiros, juízes, estudantes, enfermeiros, médicos, jornalistas, porteiros, funcionárias domésticas, instituições de ensino, saúde, Direitos Humanos, etc. entrando na corrente e se tornando multiplicadores em vários estados da União.
Portanto, nossa síntese das necessidades urgentes do Povo Cigano:
CAMPANHA NACIONAL E ADEQUAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, EM UM SÓ MOMENTO.
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