por Sulamita Esteliam

A última vez que nos vimos foi no saguão do auditório de um hotel em São Paulo, ano passado. Acabávamos de ouvir a palestra de Lula na abertura do IV Encontro Nacional de Blogueiros e Ativistas Digitais.
Lembro de ter estranhado sua atitude mais recolhida, distante da efusividade e do espalhafato que sempre pautou nossos encontros: “Sulamiiita! Como vai o bordel?”
Euzinha deixei de ser “a dona do bordel” faz tempo, você sabe. Mas foi bom revê-lo, mesmo assim. Perguntei por Cláudia Santiago, sua companheira de todas as horas e todas as lutas. “Está lá, trabalhando feito uma maluca”.
Lá é o Rio de Janeiro, onde vocês construíram um muralha de resistência contra a imbecilidade que há tempos vigora na mídia venal, o Núcleo Piratininga de Comunicação. Uma trincheira de adestramento de comunicadores sindicais e populares para a necessária e nada fácil disputa da hegemonia.
“Comunicação é política, porra! Se a gente não contar a história dos trabalhadores, sob a ótica dos trabalhadores, quem o fará?
Sábado à noite, quando vi, pelo Facebook, a notícia de seu passamento, confesso que chorei, Vito Gianotti.
Estava no meio da rua, em frente ao estádio Independência, onde uma multidão esperava a abertura dos portões. Foi minha primeira vez no estádio e meu time, o Galo, venceu, ainda que por um placar magrinho: 1 x 0 contra o Figueirense.
Mas meu coração estava pequeno e doído. A imagem de sua alegria não me saia da cabeça e sua voz de trovão ecoava dentro de mim.
Relembrei dos cursos dos quais participei, no Rio e no Recife, vários. Do quanto aprendi sobre a batalha da comunicação, das barreiras da linguagem, da importância das frases curtas para a compreensão da mensagem. “Onde cabe um ‘que’ cabe um ponto”.
Somos milhares de órfãos do carinho com que você e Cláudia sempre nos recebeu. Da sua energia contagiante a nos estimular e empurrar para a luta. Das dedicatórias nos livros que escreveram em parceria, e que, certamente, enriquecem bibliotecas Brasil afora, a exemplo da biblioteca lá de casa.
A história da luta dos trabalhadores não seria a mesma sem você. E você é eterno em nós.
Obrigada, Vito Gianotti. Descanse em paz. Você está encantado, mas sabe que, por aqui, “a luta continua, porra!”
****************
Vito Gianotti se foi aos 72 anos, de causas naturais, em sua casa, no Rio de Janeiro. Era italiano, da Toscana. Veio para o Brasil aos 21 anos. Foi padre operário na resistência à ditadura, organizou a oposição metalúrgica em São Paulo. Pesquisador das lutas dos trabalhadores, escritor de dezenas de livros, dentre eles A História das Lutas dos Trabalhadores e Muralhas da Linguagem. Junto com Cláudia Santiago, co-autora de algumas de suas obras, fundou o Núcleo Piratininga de Comunicação, no Rio de Janeiro. Têm um casal de filhos.