Andanças: ‘O Livro de Dora e suas Irmãs’ flana por Beagá, Recife e Fortaleza…

por Sulamita Esteliam

Você não faz ideia do impacto de receber a cria em suas mãos, após anos de preparo psicológico, emoções reviradas, tropeços de toda sorte, meses de emprenhamento. Longo trabalho de parto e alguns atropelos inevitáveis ao final da jornada. 

Quando meu filho me entregou o primeiro exemplar do Livro de Dora e suas Irmãs – de afetos, fantasias, dores silêncios, os pelos dos meus braços se eriçaram incontrolavelmente; as pernas bambearam e tive que buscar apoio no sofá. Sentei-me, respirei fundo e folheei a criação.

Engoli o choro, momentaneamente. Disse a mim mesma: “a ocasião é para celebrar”.

Logo cochichei de mim para mim: você não precisa ser forte, se permita desmilinguir-se inteira. Foi o que acabei fazendo, sem medo de parecer ridícula, piegas.

Tem sido um vendaval de emoções, desde então. Digno de um livro com DNA afetivo.

Dezembro foi mágico, com dois lançamentos de revirar e aquecer o coração na Macondo de origem, a Belo Horizonte de meu (des)equilíbrio: 7 e 8, sábado e domingo solares. Um verdadeiro presente antecipado dos 71 anos. 

Na Cervejaria Galpão Flor do Campo, do casal adorável, Dudu e Gardenia, em Santa Efigênia, recebi amigas e amigos de todos os tempos, colegas da faculdade e do trabalho, escritores, cartunistas e agitadores culturais, familiares. 

E havia dezenas de lançamentos literários na capital mineira, todos nas manhãs de sábado, como reza a tradição. Inclusive o lançamento mensal coletivo na Academia Mineira de Letras, com 10 autores estreando suas obras no mesmo horário – de 10h às 13h.

Ainda assim, o movimento foi muito bacana.

Bom demais, também, ser objeto do carinho das crias, dos netos, irmã, das filhas do meu companheiro Julio, sobrinhas e sobrinhos de sangue e do coração. Combustível melhor não há. 

A exemplo do livro anterior, “Em Nome da Filha”, Viseu, 2019, contei com o luxo do olhar preciso do amigo Carlos Avelin, muitíssimo obrigada, caro amigo. O Criz, namorado da minha sobrinha Marina, autora da capa e revisora, também clicou algumas, mas não sei dizer quais.

Como são muitas fotos – e olha que faltam algumas -, dividi em dois blocos de slides. Abro com a família, depois vamos para os amigos. Clique na setinha e deguste as imagens, com as devidas legenda. Caso haja algum erro, por favor dê o toque, que Euzinha corrijo:

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A família de Dora, protagonista do livro, compareceu em peso no Moda de Viola, do casal querido Eva e Geraldo, que ali, no BDI, estão desde  há muito. Era uma portinha, depois expandiu-se para a loja contígua, onde antes existia o Supermercado do Tarciso, o primeiro do bairro nesse formato.

Dona Dirce, minha mãe, que se encantou  em junho de 2000, ainda habitava este plano, qdo Geraldo abriu a bodega. Era na então modesta vendinha que ela se abastecia, enquanto a saúde permitiu, da cachacinha sagrada pré-refeições, hábito familiar desde priscas eras: tenho raiz.

Não tomava no balcão, que era mulher de respeito. Levava a garrafa e o Geraldo enchia, tirando o garrafão que trazia de um alambique lá pelas bandas de Caetanópolis, antigo Cedro.

Lá onde as famílias Gonçalves Coelho e Gonçalves Pinto – e Vieira Ramos, e Castilho, e Pereira, e Martins da Silva, e  Aquino  – moraram anos a fio, e onde meus pais se conheceram, no início da adolescência, na virada dos anos 1940 para 50.

Casaram-se em 26 junho de 1952 e migraram para a capital. Nasci em 28 de dezembro de 1953.

Note-se que não carrego sobrenome familiar de qualquer das bandas. Coisas de pai “criativo”, que até minha data de nascimento errou, me deixando mais velha um dia. Isso mesmo, fui registrada um dia antes de nascer. Há que entender meu jeito atabalhoado de ser.

As irmãs de Dora: Maria de Lourdes (em pé), Euzinha, Maria Leda (E) e Maria Aparecida-Cida, sentada. Ao fundo o baner com a foto de Dora, providenciada pela família

Personagens da história desde o título, as irmãs de Dora reservaram mesa comprida para maridos vivos, filhos, filhas, netas e netos e namoradas e namorados, que a família é grande e vive em colmeia. Alguns nem chegaram perto da mesa de lançamento e da autora.

Dona Jandira, 100 anos, sogra da Maria de Lourdes, marcou presença, junto com dois de seus filhos, que restaram vivos, e a cuidadora. Além do Márcio, que deixou minha amiga viúva, a pobre mãe perdeu três filhas, das quatro que pariu.

O marido, seu Moacir, viveu até bem depois dos 90, mas foi-se há alguns anos. Mas ela resiste, e não perde um evento que de alguma forma lhe diga respeito.

Chegou cedo, sorridente. Olhos miúdos, como ela própria, não dão a medida da esperteza que nela habita, e a conheço desde menina.

Dos dois irmãos de Dora, só o caçula compareceu – rapidamente, porque boteco não é lugar de pastor, que dirá ministro. Fiquei bem contente com sua presença, não vou mentir.

O filho primogênito e o caçula de Dora estiveram boa parte do tempo, com suas companheiras e prole, bem econômica alias: um casal e um garoto, respectivamente. O filho do meio, Dany Rafael, mora em Brasília e não pôde comparecer, envolvido com suas obrigações de professor em fim de ano.

Ademais, reunimos amigos das famílias, minha e de Dora e de suas irmãs, várias gerações. Pessoas da convivência nos tempos da juventude, gente que não economiza afeto e orgulho de ser quem é e de estar onde está.

Pessoas que ainda moram na rua em que cresci e nas cercanias também da casa onde Dora morou, e onde ainda mora uma de suas irmãs: o povo do Bairro das Indústrias, o BDI, região do Barreiro, extremo Oeste da capital mineira, cenário do livro.

E até gente que mora fora do perímetro, jamais fez parte da comunidade, ou que dela se distanciou totalmente, e se deslocou especialmente para o lançamento. 

Confira outras fotos nos slides. Posto as que me chegaram, depois completo. Créditos para Marcelo Freitas, amigo editor-fotógrafo e carregador de piano, e Hyanna da Cunha, sobrinha multiartista.

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Chacoalhamento de alma. Faz um bem danado.

Oxalá Dora e Zelita, sua mãe, e dona Dirce, minha mãe, e tia Mundica, todas encantadas, celebraram conosco o acolhimento dessa história, que é delas, e que portanto é nossa.

Porque “O Livro de Dora e suas Irmãs” é isso, também: a memória de uma teia familiar e de amizade, tecida por mulheres de fibra, raça e coração, que atravessa gerações, o tempo, e o espaço.

De volta ao Recife, o lançamento foi na semana seguinte: encontro delicioso na Livraria do Jardim, na Boa Vista, na mesma rua em que trabalhei 15 anos dos 27 e meio que habito a capital pernambucana:  com direito a bate-papo autora-leitores-leitoras, a maioria gente amiga de anos.

Vários escritores, jornalistas, professores, ex-colegas de trabalho e vizinhas, além da filha, neta e netos do meu núcleo familiar recifense. O fotógrafo José Gomes Neto registrou.

Acolhimento impecável da equipe sob o comando do Erídson, mesa de autógrafo com direito a cenário da gôndola de Autores Pernambucanos. Cidadania implícita, a partir da Literatura, na terra onde a cultura da palavra é venerada.

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Lindo. Haja coração!

Janeiro foi de troca adorável com leitoras e leitores, via redes sociais; depois, em outra postagem mais adiante, mostro detalhes desse diálogo, porque diz muito do livro.

Injeção de combustível para a caminhada, que, bem sei, é longa. Todavia, já executamos o quarto passo, terceira cidade e estado.

Fortaleza, foi a estação seguinte, com desembarque em 6 de Fevereiro: Euzinha e o livro dividimos a mesa ‘Artesanato da Palavra’, pilotada pelo escritor e autodenominado “chacoalhador cultural”, Ricardo Kelmer, na Feirinha do Cantinho do Frango, bar e restaurante na Aldeota.

Troca maravilhosa, inclusive de livros. Sou grata.

Ana Karla Dubiella, escritora e jornalista sugeriu o contato, bastante receptivo. Uma das minhas irmãs por escolha, ela assina a orelha do livro. E empenhou-se na divulgação do evento, além de me hospedar.

Só não nos lembramos da foto, e ela clicou a maioria.  Mas aqui vai o cartaz do Clube das Musas de janeiro, a primeira roda de conversa do ano com Mona Gadelha, compositora, cantora e jornalista que teve Ana como uma das convidadas.

Euzinha estive na de fevereiro, que celebrou um ano do evento, surgido em oposição ao Clube dos Gatos, que também acontece no Cantinho do Frango. O mais puro espírito cearense.

Algumas pessoas queridas, que atenderam ao convite e compraram o livro também ficaram sem registro. Por exemplo, o escritor Nilton Almeida e sua companheira Germana, ambos jornalistas.

Falo de Nilton porque ele me acolheu, por assim dizer, quando cheguei à Fortaleza: me indicou para o primeiro trabalho profissional, como repórter da TV Ceará, em 1995.  Capturei a foto na internet.

Na TV, conheci Ana Karla, então minha chefa de reportagem; a coisa se inverteu quando a levei para minha equipe na Economia do jornal O Povo.

Anos antes, Euzinha e Nilton fizemos parte de duas gestões sucessivas da Fenaj – Federação Nacional dos Jornalistas, então sob o comando de Armando Rollemberg. Ele foi secretário-geral, Euzinha diretora de base por Minas Gerais e depois suplente de diretoria.

Já estava no Recife quando Nilton, secretário de Cultura e Desporto do Ceará -1998/2002 – me incluiu na Bienal de Literatura de 1999, para lançar o “Estação Ferrugem”, Vozes/Prefeitura de Belo Horizonte, 1998, meu primeiro livro. Que, aliás, escrevi inteiro em Fortaleza.

Como se vê, é muita história, e a vida de fato “embrulha tudo”, já escreveu Guimarães Rosa.

E a dose dupla do lançamento na capital cearense foi no mesmo local, em ambiente contíguo: o Clube das Musas leva escritoras cearenses para conversar sobre suas atividades; às vezes foge à regra, como foi no meu caso. A produtora Maíra Sales, que não está na foto, engatilha tudo.

Comigo estiveram poeta e artista gráfica Raísa Christina e a escritora e também jornalista Natercia Rocha, as duas primeiras à esquerda na foto, respectivamente.

A dona do espaço, Adriana Fonseca, de branco na foto, ao lado de Mona, de azul marinho, é a expressão da simpatia: fez questão de comparecer à abertura do evento para nos dar as boas-vindas, gentilmente. E comprou meu livro.

Escrevi em meu perfil no Instagram: foi uma tarde-noite memorável, com a presença de gente acolhedora e afetuosa, na medida em que nos faz feliz. 

A começar pela minha neta, Larissa Neves, que também é Estelian – assim, com “n”, contribuição do avô “distraído”, ora estrelado, que assim registrou as crias que compartilhamos. Ela usou o intervalo entre atendimentos, é nutricionista, para prestigiar a avó.

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Mesmo com a chuva que desabou sobre a cidade ao longo do dia, a casa lotou, como acontece toda quinta-feira. Foi gratificante, obrigada, e aqui vai por atacado – aqui, lá e alhures.

Pude rever pessoas com quem convivi nos anos em que morei em Fortaleza, inclusive ex-colegas de trabalho e de militância sindical. Houve quem passou por lá saindo direto do trabalho.

E teve o pós, que me levou a um restaurante próximo à pousada para qual me mudei após uma semana ocupando o escritório da minha irmã cearense. Coloquei um exemplar do livro sobre a mesa, vai quê…

O garçon Patrício notou, perguntou, disse que gosta de ler, o filho também, contou histórias: ficou com o livro. Dediquei para ele, que posou para fotos, posamos juntos.

E aí o cliente  que nos observava quis saber da história, falei, mostrei a capa e, lá se foi o último exemplar da sacola com o Sebastião.

Ancoragem inadiável: em data conveniente para dar um abraço de aniversário em minha neta, que completou mais uma volta em torno do Sol dia 16. E o que seria antecipado, terminou sendo presente, por acaso do adiamento da retomada das aulas de natação, por conta do chuvaréu no Recife.

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Em Fortaleza, também, choveu a cântaros – sempre na madrugada e no início da manhã, ao menos. Não me lembrava que  o “inverno” (chuva em nordestinês) lá é no verão, ou passou a sê-lo.

Tome calor no resto do dia e noite adentro! Mais do que nunca, é fato, vivemos sobre um braseiro.

Março é logo ali, e este ano abriga a folia. Não adianta misturar as plataformas, que são bem físicas, aliás, mas incompatíveis. Retomar o périplo da versão escritora-caixeira-viajante, portanto, só em finais de março ou início de abril, espero, em Brasília.

E pode vir surpresas por aí…

Só digo que as temporadas de lançamentos até aqui recarregaram minhas energias.

Foi uma profusão de afetos de pessoas amigas, de ontem e de hoje, do meu núcleo familiar e da família ampliada. 

E a receptividade do livro tem sido maravilhosa, confirmando para mim o que sempre considerei ao insistir em escrever para contar histórias.

Vale à pena transformar vidas em palavras, realidade em fantasias, dores em emoções de cura, silêncios em eclosões de sentimentos de empatia e perdão.

Conhecer a própria história é essencial para entender-se. Revivê-la é terapêutico. A alteridade é curativa, a compreensão do outro é reencontro consigo mesmo.

Aproveito a postagem única no mês para agradecer a todas e todos que contribuíram na vaquinha para impressão do livro. A campanha de pré-venda arrecadou o suficiente para pagar a gráfica. Muito obrigada, mesmo.

Houve quem apenas doou, sem acessar a recompensa: o livro com desconto em escala proporcional à contribuição. Muito grata. Todavia, se deseja o livro, deixe seu contato nos comentários, que a gente combina.

Da mesma forma, as vendas nos eventos e pós-lançamento têm sido fundamentais para cobrir as demais despesas com a edição, divulgação e viagens.

Carrego uma sacolinha com livros aonde quer que eu vá. Quase sempre encontro freguês, a exemplo dos rapazes abaixo, Patrício e Sebastião, num restaurante em Fortaleza.

Para se vender livros, autora e autor independente no Brasil tem que ter vocação para caixeiro-viajante, sem pejo, botar o pé na estrada – ou nas nuvens, no caso.

Claro, com o auxílio luxuoso da “Bela”, ou assemelhadas, que oferece descontos importantes nas passagens aéreas para familiares de funcionários de linhas aéreas. É o meu caso, felizmente. “Bela” é o apelido dado à condição pelo pai da nossa filha aeroviária.

Devo lembrar que o livro custa R$ 60,00 e está à venda também em livrarias físicas, confira:

Pode ser adquirido, também no site da Comunicação de Fato Editora, na  Estante Virtual.  Se a opção for um exemplar autografado, fale comigo pelas redes sociais ao lado ou via email: sesteliam@gmail.com, que também é chave do PIX .

Fecho com um episódio da tertúlia familiar, um toque cômico à resenha: a gráfica enviou a prova para o escritório da minha nora, em Belo Horizonte, aonde deveria ocorrer a entrega para armazenamento da edição, ao invés de encaminhar à editora.

O lançamento só aconteceria no mês seguinte, 15 a 20 dias depois, e Euzinha no Recife, tive de me contentar em ver as imagens. Pedi a ela que levasse para casa e fotografasse para eu dar a largada na pré-divulgação.

Aí, meu filho aproveitou para tirar onda com as irmãs, na típica brincadeira familiar que invariavelmente surte efeito: enviou pelo zap-zap uma foto segurando o livro, com a legenda: “Em primeiríssima mão.”

Reação imediata da terceira irmã:

– Por que você!?

– Uai, sou o tchutchuco, kkk…

Levou de volta um “ridículo!” Mas não se conteve: me encaminhou a treta, se acabando de rir. Pedi que explicasse à irmã o equívoco da gráfica, ou me complicaria, que guardasse o exemplar para mim. Ele, porém, estava se deliciando, e respondeu:

– Já expliquei que a senhora queria saber minha opinião, primeiramente. Vou guardar para a senhora o livro, não se preocupe. Mas serei o primeiro a ler depois de impresso, disso não abro mão; aliás, já comecei.

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Crédito das fotos: 

  1. Carlos Avelin: Galpão Flor do Campo
  2. Marcelo Freita e Hyanna da Cunha: Moda de Viola
  3. José Gomes Neto: Livraria do Jardim
  4. Ana Karla Dubiela e Maíra Sales: Cantinho do Frango

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