Mulheres em “revolução silenciosa”

Fotos Claúdia Ferreira/Agência Patrícia Galvão e Ângela Moreira-RJ
Por Sulamita Esteliam

A política seria melhor se houvesse mais mulheres em postos importantes. É o que acreditam 79% das mulheres ouvidas, recentemente, pela Fundação Perseu Abramo, em pesquisa que ainda será divulgada, oficialmente. Entretanto, apenas 49% dos homens têm a mesma opinião a respeito. Isso explica, em parte, por que haveria menos mulheres na política. Afinal, a política e o poder (e a mídia) são masculinos.

Todavia, a análise do comportamento do voto nas últimas eleições indica que está em curso o que o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, chama de “revolução silenciosa”. Já no primeiro turno, duas mulheres candidatas presidenciais, Dilma Roussef e Marina Silva, abocanharam 68 milhões de votos. Significa que dois terços do eleitorado votou nelas. Apesar de toda sorte de manipulações preconceituosas e discriminatórias, e isso não é pouca coisa.

José Eustáquio Diniz, demógrafo/Ibope

Diniz coordena a pesquisa do Ipope àcerca, e garante que não encontrou nada parecido em nenhum país grande no mundo. “Isso é importante para deixar claro que aquela ideia de que o povo não vota em mulher é equivocada. Muita coisa mudou no Brasil”, avalia.

Mérito que ele atribui ao movimento feminista, que há 23 anos trouxe suas bandeiras – e de homens que ao longo da História contribuíram para isso. “Na pesquisa qualitativa fica claro o quanto os homens têm a compreensão do papel da mulher no Brasil. As mulheres são maioria nas universidades, no doutorado, inclusive. Possuem sete anos a mais na expectativa de vida. O avanço é espantoso. E o próprio fato de 2/3 do eleitorado votar em mulher é surpreendente”, assinala.

Gustavo Venturini, Sociólogo/Perseu Abramo

O sociólogo Gustavo Venturini, responsável pelo levantamento da Perseu Abramo, assegura que “cresceu a percepção no geral de que as mulheres estão preparadas para governar em qualquer instância.” Segundo ele, também, aumentou o número de mulheres que se declaram feministas.

A íntegra de tais estudos será divulgada até março de 2011. Um aperitivo, porém – destas e de outras pesquisas -, foi servido às mulheres presentes no seminário Mulher e Mídia 7, de 02 a 04 de dezembro, no Rio. Na organização, a Secretaria de Políticas para Mulheres do governo Federal, o Instituto Patrícia Galvão e a Unifem. Esta reles blogueira se inscreveu, foi aceita e teve o privilégio de acompanhar o seminário, de riqueza ímpar.

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Não obstante, a “revolução silenciosa”, há pedra no meio do caminho da ascensão das mulheres a instâncias de poder, em particular quando se trata do Legislativo. Que ninguém se engane: elas detêm nítida percepção a respeito. Dentre as ouvidas pelo estudo da Perseu Abramo, 49% não têm dúvida de que o machismo e seus reflexos estão na base do pouco acesso feminino a esta seara. Para 13% delas, o motivo é a discriminação em geral e para 8% a falta de oportunidade.

Tereza Sacchet, cientista política/USP

Tais constatações se conectam com dados de outra pesquisa, desta vez, do Consórcio Bertha Lutz, que analiza o financiamento das campanhas às eleições proporcionais – para deputados estadual e federal. A cientista política Tereza Sacchet, da USP, é uma das participantes do levantamento, que está em fase de análise. Os números apontam que as mulheres recebem menos da metade do dinheiro que é designado pelos partidos aos candidatos homens, e isso inclui os partidos de esquerda.

Sacchet constata que “as mulheres têm menos história política do que os homens, o dinheiro para elas ainda é mais importante. Para ter as mesmas chances de sucesso, elas precisam gastar mais”. Lembra, ainda, que o Brasil tem apenas 8,8% de mulheres eleitas para o parlamento. Dentre todos os países da América Latina, só não perde para o Panamá. A Argentina e a Costa Rica têm 38%. “Sem dinheiro, não vamos conseguir fazer com que mais mulheres vençam as eleições”, acredita.

Tatau Godinho, Marcha Mundial de Mulheres

A pauta das feministas e do movimento de mulheres aponta caminhos de solução. Há, pelo menos, dois temas centrais: democracia dos meios de comunicação, sobretudo na radiodifusão, que são concessões públicas; e reforma política que promova transparência no sistema partidário. Em miúdos: lista de candidatos pré-ordenada, financiamento público de campanha e barateamento  do custo, através do contorno das regras da política.

Sem dourar a pílula, Tatau Godinho, da Marcha Mundial de Mulheres, dá o tom: “Democracia a meias não favorece mulheres, negros e setores discriminados. Se o movimento de mulheres quer obter um conteúdo de mudança precisa incidir nesse debate”.´

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Voltaremos ao assunto, oportunamente.

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