Código Florestal: tempo para refletir o futuro

por Sulamita Esteliam

Os amigos com interesses diretos na matéria – e eu os tenho de um lado e do outro – que me perdõem. Mas falta bom senso na discussão em torno do Novo Código Florestal, um samba do crioulo doido gerido pelo, irreconhecível, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP).  Já li e ouvi de tudo: inclusive gente, que hoje cumpre para além da lei atual, ameaçar deixar o estritamente legal e desmatar o resto, “só de raiva”.

Como se tal atitude não comprometesse tão somente o futuro, no mínimo, de seus herdeiros. Por que, se há uma coisa que a natureza não perdoa é abuso: toma de volta tudo que lhe surrupiam. Estão aí os cataclismas para não deixar mentir.

Sei que o assunto é complexo, envolve mil e um interesses, principalmente, a nossa sobrevivência. E sobreviver, não significa, exatamente, encher a barriga de comida e as burras do vil metal – não que eu tenha algo contra. E é por isso mesmo que requer esforço para buscar um ponto de equilíbrio – para além do próprio umbigo.  Até para produzir, ou criar bicho, é preciso terra fértil e água em abundância. Sem preservar, não teremos nem uma coisa nem outra.

Por que o Planeta, meu irmão e minha irmã, este se reinventa. A humanidade é que paga o preço.

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Odeio admitir, mas tenho que concordar com a “Ouvidora Geral da Nação” – copyright Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada – a global Míriam Leitão (que ainda por cima é mineira). Em sua coluna de domingo, reproduzida pelo Diário de Pernambuco, ela foi na mosca, pouco importa os motivos. Reproduzo o trecho a que me refiro. Aspas para ela:

(…)

Os produtores pensam estar protegendo seus interesses quando defendem anistias e leis que aceitam mais desmatamento. Podem estar secando seus rios, revoltando os leitos que vão mostrar suas fúrias nas tempestades, minando o solo, que vai secar, desabar ou se partir nas crateras da erosão. Podem estar contratando o acirramento de fenômenos climáticos extremos que destruirão suas terras, plantações e a economia do país. 

O dilema que está diante de nós é maior do que temos visto. O Brasil é ao mesmo tempo um dos maiores produtores de alimentos do mundo, o país com a maior diversidade biológica do planeta, um dos grandes reservatórios de água. Como é possível conciliar a abundância das chances que temos? Há países que administram a escassez. Temos sorte.

(…)

Os produtores têm razão em reclamar que a lei mudou no meio do caminho em alguns pontos. Olhar esses pontos com sinceridade é necessário. A ANA lembrou as políticas de incentivo ao desmatamento e as alterações de tópicos da lei e separou o que o projeto misturou: “Quem agiu de boa fé” e “quem comprovadamente gerou passivo ambiental.” O projeto mistura tudo quando anistia quem desmatou até 22 de julho de 2008. O texto como foi escrito estatiza os custos e privatiza o lucro. 

Os cientistas alertam que uma pequena alteração feita no texto representa um risco imenso. Se a mata em torno dos rios tiver que ser calculada a partir da menor calha, e não das bordas maiores, os rios da Amazônia que enchem e encolhem ao longo do ano podem perder 60% da sua proteção. 

A ANA, a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) avisam que não se deve mudar o código. A tarefa é aprimorar a lei e melhorar a implementação. A ideia de que uma lei deve ser jogada fora porque muitos não a respeitaram é estranha. Ela não foi entendida nem pelo governo que a baixou em 1965, mas para nossa sorte ela ficou atual. Protege áreas frágeis da erosão e dos deslizamentos. Protege rios e mananciais de água. Cria a obrigação de cada proprietário reservar uma parte da sua terra para a vegetação natural. Está em sintonia com o tempo da mudança climática que já está entre nós. 

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Míriam acerta, também, quando escreve que “a oposição desistiu do futuro” – custo a crer no que leio. Mas erra quando afirma que “o governo decidiu escolher o menos pior”. Também movido a pressão (abaixo), o governo não aceitou a anistia de reserva legal aos produtores rurais com até quatro módulos fiscais. Antes, aceita a regra, apenas, para agricultores familiares e cooperados.

Em consequência, a votação do relatório foi adiada, uma vez, mais: em princípio para a manhã desta quarta-feira, 11.

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Sobre o assunto:

Na Agência Câmara:

Votação sobre o Código Florestal fica para quarta

Governo diz que resta um ponto de divergência

Código Florestal regula 5,2 milhões de propriedades no Brasil

No Portal Terra:

Sem acordo, votação do Código Florestal é adiada novamente

Em Outras Palavras:

Entrevista com Marina Silva: Para salvar o Código Florestal

Via, EcopolíticaCódigo Florestal: Por que é possível cumprir

Em Carta Maior:

A visão dos movimentos sociais

Outros:

A visão dos ambientalistas gaúchos

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