Os véus do discurso anticorrupção

por Sulamita Esteliam

Uma série de protestos está marcada para esta terça, 15, Dia da República, em várias capitais do país, Recife inclusive. Convocados pelas redes sociais, Facebook, sobretudo, levantam à bandeira do combate à corrupção, especialmente. Reivindicam a inclusão do mal no rol dos crimes hediondos.

“Indignados” é como se autodenominam, numa referência à explosão mundial de protestos – da Espanha, passando pela Grécia e pelo Chile, a Wall Street.

“Apartidários” é o como se apresentam. Até recomendam que os participantes levem seus cartazes, mas “deixem em casa suas bandeiras”.  Perguntinha que me ocorre, e não quer calar: alguém já viu um tucano ou demo, por exemplo, mesmo que da juventude, carregar bandeira do partido em algum protesto?

Contudo, melhor acreditar que essa “gana” de protestar leve à reflexão sobre as raízes da corrupção. Afinal, ninguém se autocorrompe. Há sempre um corruptor por trás de um corrupto.

A roda da corrupção gira a partir das mínimas coisas e se alimenta na ilusão da “normalidade”. Começa no “cafezinho” para evitar a multa no trânsito, passa pelo “agrado” para agilizar um processo na repartição, e desemboca nas vultosas comissões que definem fornecimento de produtos e serviços, em todos os níveis e instâncias de poder.

É assim no mundo inteiro. Em Terra Brasilis, está na gênesis; tem pelo menos 500 anos. Padre Antônio Vieira já escrevia que nestas terras se rouba até ao ladrão – mesmo que não tenha dito ou escrito de onde vem o nosso DNA. Mas nós sabemos.

Bom, de qualquer forma, ver brasileiro classe média se mobilizando por alguma causa alegra muita gente; e deixa muitos mais de orelha em pé. Memória é um problema sério. Um país sem consciência de sua História não pode cobrar dos seus o temor da catástrofe.

Tomara, mesmo, todo esforço de organização seja fruto da real vontade de mudar o sistema. Tomara seja o impulso de pressionar para se corrigir o que está errado o combustível que os move, e não o moralismo de fachada. Tomara não seja um “modismo”, um equívoco a serviço da hipocrisia, dos interesses de plantão.

***************************************

O vídeo abaixo, que me chega via Rede Mulher e Mídia, em torno de reunião de senhoras da elite paulistana, diz a que me refiro. O discurso é impressionante, insano, eu diria.

A propósito, vale ler o excelente artigo da jornalista Maria Inês Nassif, em Carta Maior, escrito para o Seminário Internacional sobre Corrupção, realizado em Porto Alegre, dia 07: O poder permanente de derrubar governos.

4 comentários

  1. A ausência de motivação, o excesso de botox, o tédio, e a subserviência ao macho provedor,
    transformam essas pobres senhoras num caso sério, pois revelam a existência de uma terrível
    síndrome que abate algumas mulheres com muito dinheiro à sua disposição, e nenhuma
    imaginação para usufrui-lo conscientemente, e com criatividade…

  2. Apesar de estarem as mulheres citadas no vídeo ainda carregando algum ranço do elitismo, o que nesse caso é apenas um distintivo de costumes, elas se mostram muito mais ativas que muitas pessoas pseudo-indignadas que vemos por aí, alardeando sua revolta de conveniências, num permanente comício do “Ameaço e xingo aquele que me dá menos vantagens!”.

    Não há nenhum patriotismo em defender seus próprios interesses, se apelando para a demagogia barata, como no caso dos descabidos protestos na USP. E isso é regra no Brasil. “Não te incomodo se você não ameaça as barganhas do meu mundinho medíocre! Te apóio se você fortalecer minha insanidade! Te idolatro se seu deus for mais falso que o do meu chefe!”

    Cadê meu diazepam??

  3. Boa noite Sula.
    Estas mulheres com cafezinhos e patês nada vai mudar. Ainda bem, pq se dependesse delas e seus maridos a mudança seria para piorar a vida dos pobres deste país. Não podemos chamar esse grupo de classe média. A postura. os conceitos e preconceitos, o ar de superioridade revelam um burguesia retrógada. Devemos pensar que enquanto elas falam em corrupção os seus esposos podem estar corrompendo alguém dos govenos (municipal, estadual e federal) para vender serviços e produtos. Como você afirma, não há corrupto sem corruptor. Estes estão localizados nos grandes empresarios e altos executivos que se relacionam negocialmente com os governos.
    Por outro lado Sulamita, os que lutaram (sindicatos, movimento polular e ONGs) tantos anos por um país justo, sem corrupção e transparente não se mechem. O que escuto de muitos “companheiros” é que em nome da governabilidade tudo pode e em nome de não fazer coro com a direita vai se ficando quieto. Este é o discurso, mas na verdade eu e você sabemos os interesses das lideranças sindicais, populares, sociais e de ONGs que estão próximas do governo.
    Um beijo. Estou acompanhando seu blog e gostando muito.
    Ivanildo

Deixar mensagem para Ebrael Shaddai Cancelar resposta