por Sulamita Esteliam
Há três anos, escrevi aqui no blogue longa crônica sobre Educação e Cultura. Na oportunidade, apresentei a quem eventualmente desconhecia sua existência, a professora e deputada estadual catarinense, a primeira a ser eleita no Brasil, Antonieta de Barros.
É da sua lavra a criação do Dia do Professor (e da Professora), em 12 de outubro de 1948, com efeito em seu estado e só nacionalizada no governo João Goulart 16 anos depois.
Replico a postagem anterior ao pé deste texto.
Nesta quarta, me deparei com postagem no Instagram de um senhor que traz na bio a qualificação como “jornalista”. A profissão degrada-se, mas há sobreviventes e assemelhados.
Num vídeo, o referido apresenta a redescoberta da pólvora: quem “criou o Dia do Professor” teria sido certo professor paulista, cujo nome não gravei – e não consegui recuperar porque não sigo o autor da postagem.
A pérola fica mais apetitosa ou brilhante quando o tal afirma que o “criador” teria lançado a ideia “numa reunião da categoria para discutir Educação”; numa determinada escola paulista, em 1947.
Ele informa, ainda, que a data celebrativa, 15 de outubro, se tornaria estadual, em São Paulo, em 1948, e nacional em 1964 – antes do golpe civil-militar que derrubaria Jango e nos imporia 21 anos de trevas (registro desta blogueira).
Ideia inspirada na data da sanção da mesma Lei da Educação Básica de Dom Pedro I: a fonte onde bebeu Antonieta para defender o projeto de lei que criou a data, aprovado por seus pares da Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Lei, portanto.
Detalhe: só tornada nacional por João Goulart, 16 anos depois. Tudo no tempo em que “idéia” ainda se escrevia com acento – no singular e no plural.
Certamente é mera coincidência.
O que me leva a resgatar, antes de reblogar a crônica de 2021, o comentário da minha irmã de alma, Eneida da Costa – jornalista formada em 1979, pela Fafich/UFMG, junto com esta reles escriba -, a propósito do “apagamento” da educadora Antonieta de Barros.
Escreve em 23 de outubro de 2021, na sessão de comentários, usando a comparação que fiz com outro educador brasileiro, este de renome internacional, Paulo Freite.
Que, aliás, a “inteligentzia” de sombra recente gostaria de apagar, também. Tudo que é luz amedronta quem gosta do escuro.
Eneida diz:
“Querida Sula, Tal Mineira
O que fizeram com Antonieta chama-se apagamento.
Mulheres, seus escritos, ideias, pesquisas não são citadas e nem indicadas nas bibliografias.
Mulheres pretas são duplamente apagadas.
Eu, mulher preta, apaguei o nome da única professora negra que tive na faculdade. A professora de Semiologia.
Hoje, aprendi a buscar, ler, citar e indicar a leitura dessas intelectuais.
Ela são heroínas. Enfrentaram sozinhas a solidão intelectual. Enfrentaram o racismo, a misoginia, o machismo e toda forma de preconceito que as lançaram no limbo.
Mas, a história produzida por mãos que tecem pontos e desatam nós pescaram essas bravas e as trouxeram para junto de nós.
Nós que nos importamos e queremos conhecê-las. Aprender com elas. Reverenciá-las. Divulgá-las.
Fecho com o poema que brotou enquanto trabalhava a postagem:
Inspiração
Está na cara
que o racismo,
a misoginia,
e o machismo
escondem o medo
da vida presente.
Só não vê quem escolhe
desconhecer.
Faz bem enxergar
para além da névoa
que teima em esconder
o esbulho indigente.
O tempo é corcel alado.
Desmascarado
não deve correr
à solta,
como enxurrada
em tempo de lua prenha.
O que os olhos veem,
o coração sente.
(Sulamita Esteliam, outubro 2024)