por Sulamita Esteliam

Ando soçobrando ante múltiplos afazeres. Na verdade, obrigações que implicam responsabilidade intransferível, no plural. Pois bem, sobrou pro blogue o seixo – furada ou toco em pernambuquês. Cá estou de volta, entretanto, ainda que meia-perna. Quando a gente está entre quem nos respeita, acabamos por abusar da boa-vontade. É da natureza humana.
Hoje, especialmente, a semana bateu com força em minha porta. Então, me lembrei dos versos do poeta a quem fui apresentada por um imenso cartaz de rua-out door, plantado bem no pátio interno da minha (eterna) faculdade quase sessentona, como Euzinha – a inesquecível e inestimável, Fafich/UFMG. Carregava os seguintes versos, com título, aspeados:
No Caminho com Maiakóvski
Na primeira noite eles se aproximam / roubam uma flor / do nosso jardim./ E não dizemos nada./ Na segunda noite, já não se escondem : / pisam as flores, / matam nosso cão, / e não dizemos nada./ Até que um dia / o mais frágil deles / entra sozinho em nossa casa, / rouba-nos a luz, e, / conhecendo o nosso medo / arranca-nos a voz da garganta./ E já não dizemos nada.
O título, confesso, levou-me à confusão durante anos e anos. Até descobrir que o autor não era o maior poeta russo de todos os tempos, aquele que melhor traduziu em versos a revolução socialista do início do século XX. Soube, então, que o poeta é um brasileiro, Eduardo Alves Costa, nascido em Niterói, no Estado do Rio de Janeiro.
Entretanto, devo admitir, hoje já não me lembrava mais do nome do veículo do meu despertador. Só Maiakóvski me vinha à cabeça. E fui pro “pai dos burros” pós-moderno, o virtual, claro, limpar minha memória. Em busca dos versos que marcaram meu olhar de juventude, menina, já casada e mãe, tudo clareou – aqui.
Importante dizer, para quem não conhece: passei no vestibular grávida do meu primeiro filho, e ao entrar na faculdade, só frequentei uma semana antes de parir, e depois de cumprir a licença-maternidade – com direito a matérias e trabalhos em casa, na recém-inaugurada lei; usei um, dos três meses a que fazia jus.
A porta da universidade pública era a minha redenção, e me ascendeu à classe média, e, de cara, me colocou em choque. Não bastasse todas as minhas idiossincrasias de raiz, o portal que incluía Maiakóvski, como quê, me trouxe de volta à real.
Não havia Lula, nem Dilma, nem Bolsa Família, nem Enem, nem Pró-Uni, pois… O funil era amplo, geral e irrestrito. E não havia luz no fim do túnel. Eram tempos de ditadura, então: 1975.
Quedei-me em franca pescaria neste 21 de março de 2013. É o dia do aniversário do meu neto-caçula, Mateus, criança abençoada e muita amada, filho do meu filho que foi para a faculdade na minha barriga.
É Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial , definido pela ONU em 1976, e Dia Internacional da Síndrome de Down, também.
O “pai dos burros” digital me revela, ainda, que estamos no 80º dia do ano do calendário gregoriano (81º para os bissextos), o nosso calendário oficial. Significa que faltam 285 dias para acabar 2013.
Então, há tempo para refletir, conforme Maiakóvski. Fecho com ele:

E então, que quereis?…
Fiz ranger as folhas de jornal
abrindo-lhes as pálpebras piscantes.
E logo
de cada fronteira distante
subiu um cheiro de pólvora
perseguindo-me até em casa.
Nestes últimos vinte anos
nada de novo há
no rugir das tempestades.
Não estamos alegres,
é certo,
mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história
é agitado.
As ameaças
e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio,
cortando-as
como uma quilha corta
as ondas.
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Postagem revista e atualizada às 21:13.
Agradeo envio. Natanael Lima JrEditor http://www.domingocompoesia.com Date: Thu, 21 Mar 2013 23:48:51 +0000 To: natanaeljr12@hotmail.com