Glenn Greenwald: um jornalista que vale por uma roda inteira, viva

Glenn Greenwald e a vergonha alheia da bancada do que já foi Roda Viva – captura de tela do Tijolaço
por Sulamita Esteliam

Minha filha Gabi me ligou por volta das 22h30 para saber se Euzinha estava assistindo a entrevista do Glenn Greenwald, do The Intercept no Roda Viva.

Disse que não. Há anos não perco meu tempo com o que, para mim, é roda morta. Exemplo de anti-jornalismo. Desde, sobretudo, o comando de um certo Augusto Nunes, que pode ser chamado de tudo, menos de jornalista, e que agora arrota sua boçalidade e insensatez nas ondas do rádio…

E ela me respondeu que esta velha mãe estava perdendo. Gabi estava adorando ver o Glenn “jantar seus coleguinhas”….

Abstenho-me desse tipo de ceia, onde os comensais lambem as babas de convidados e comem suas sobras, quando estes são do gosto de seus patrões. E vomitam naqueles que não passam no crivo de quem lhes paga os salários.

Vergonha alheia.

Nessas horas amo as escolhas que a vida me levou a fazer, há décadas, pela ordem: deixar o sindicalismo – como defender uma categoria onde é cada vez mais comum esse tipo de trabalhador!? – e sair da mídia convencional.

As exceções apenas confirmam a regra.

Em pauta a #VazaJato, que há mais de dois meses mostra que a Lava Jato, uma operação que pretensamente combateria a corrupção neste país, tornou-se uma quadrilha praticante de toda sorte de ilegalidades para fazer valer seus credos.

Agiu todo o tempo como partido político, ao revés de seus papel constitucional.

Novas revelações, nesta terça, mostram inclusive que não apenas Sergio Moro tinha, e tem, pretensões políticas, para além de bloquear Lula e empatar o PT. Deltan Dalangnol, o chefe da Força Tarefa também; almeja o Senado, o que seria legítimo, se não o fosse no exercício do Ministério Público.

De bandalheira em bandalheira, trazidas nuas para o espetáculo público, pode acabar vendo o sol nascer quadrado.

Corrijo: poderia, não estivéssemos no Brasil.

Só aqui é possível assistir à tamanha desfaçatez e inconstitucionalidades como se fosse capítulo de uma novela grotesca e sem fim.

Em qualquer outro lugar do mundo todos os integrantes da Força Tarefa e da República de Curitiba estariam defenestrados de seus postos. E, se não presos a bem da decência e da sociedade, sob severa investigação.

Isso inclui o ex-juiz inquisidor que tornou-se ministro porque favoreceu, com suas patranhas para que o Brasil experimentasse o fogo dos infernos.

O que li e ouvi no day after, nos grupos dos quais participo nas redes e na blogosfera progressista, não me deixa mentir. Muito menos lamentar não ter cedido à tentação de ouvir e ver o Glenn dar lição de Jornalismo a essa gente lamentável.

Pornografia pura, como bem explicita o sociólogo e especialista em Relações Internacionais, Marcelo Zero, que assessora a liderança do PT no Senado.

Captura de tela da RBA

Transcrevo, a partir do Vi O Mundo, o artigo publicado originalmente no Brasil 247, onde é colunista:

A Porta-Voz Pornográfica

por Marcelo Zerono Brasil 247

A entrevista do mundialmente consagrado jornalista Glenn Greenwald a pessoas que se autodenominam jornalistas no Programa Roda Viva foi um dos mais patéticos espetáculos da mídia brasileira.

A turminha desqualificada, com uma honrosa exceção, em vez de questionar sobre as aterradoras revelações da Vaza Jato, não desmentidas por ninguém, dedicou-se, com a empáfia beócia de um procurador “lavajateiro”, a criticar o único jornalista de verdade presente por, pasmem, fazer jornalismo.

Reproduziram, com fidelidade canina, os argumentos ridículos de Moro e Deltan sobre o “hacker”.

Tentaram o tempo todo desqualificar Glenn e torná-lo um criminoso por revelar evidências concretas sobre os crimes da Lava Jato.

Insinuaram sistematicamente que Glenn e Manuela D´Ávila teriam participado ou sido coniventes com um crime de invasão de privacidade pago por alguém.

Nenhuma palavra, um sussurro sequer, sobre os aberrantes e evidentes crimes de Moro e Deltan, que mudaram, para pior, muito pior, a história recente do Brasil.

Equipararam as divulgações do Intercept com os vazamentos ilegais da Lava Jato, como se Glenn fosse um promotor ou um juiz com o poder de mandar prender alguém ou investigar alguém.

Tentaram o tempo todo arrancar uma “confissão” de Glenn sobre sua fonte, ignorando um dos princípios mais comezinhos do jornalismo.

Demostrando também total ignorância sobre fatos recentes, insinuaram que a Lava Jato teria deixado um grande legado, e que único legado da Vaza Jato seria o da inviabilização do combate à corrupção no país.

Ora, o legado da Lava Jato foi eminentemente destrutivo, inclusive no campo econômico.

Recuperou, até agora, cerca de US$ 10 bilhões, mas, apenas em 2015, provocou em prejuízo de mais de US$ 140 bilhões.

Deu enorme contribuição para destruir a cadeia de petróleo e gás, a construção civil pesada nacional e a engenharia brasileira. No Brasil, o combate à corrupção causa um prejuízo muito maior que a corrupção. Graças à Lava Jato e seus “heróis”.

Mas o prejuízo maior da Lava Jato, como ficou claro nas divulgações do Intercept, foi à democracia.

Com efeito, a Lava Jato, além de ter sido instrumental no golpe de 2016, na prisão sem provas do presidente Lula e na eleição fraudada que levou Bolsonaro ao poder, atingiu o cerne da democracia brasileira.

Em nome de um combate partidarizado e ideologizado à corrupção, atingiu-se o que a democracia tem de mais sagrado: o devido processo legal, a presunção da inocência e o direito de todo cidadão de ter acesso a uma justiça isenta.

Esses são princípios democráticos básicos e fundadores, que protegem o indivíduo contra o arbítrio dos agentes do Estado. Por isso, o writ inglês de Habeas Corpus de 1679 é o documento considerado unanimemente como a base da democracia moderna.

A Lava Jato, contudo, tornou aceitável que o Estado atropele tais direitos básicos, desde que seja para perseguir o inimigo político, na luta contra a “corrupção”.

O problema é que esse direito penal do inimigo acaba se tornado um inimigo mortal da democracia. Exemplos históricos abundam.

A chamada “República de Curitiba” tornou-se um Estado autoritário dentro do Estado democrático.

Regia-se por regras próprias, independentemente de quaisquer controles democráticos.

Por pouco não conseguiu até orçamento específico, com base em multa ultrajante obtida pela operação nos EUA contra a Petrobras.

Em todo esse processo destrutivo e antidemocrático, a Lava Jato contou com um grande aliado de peso: a imprensa oligopolizada.

De fato, nossa gloriosa imprensa, com raras exceções, recusou-se a fazer o que Glenn e outros do Intercept estão fazendo: jornalismo.

Não questionaram nada, não investigaram nada. Limitaram-se a reproduzir, como bem treinados papagaios, todas as informações que Deltan e Moro tinham interesse em divulgar.

Na realidade, a nossa grande imprensa foi mera porta-voz da Lava Jato e seus “heróis” antidemocráticos.

Além do interesse político na inviabilização de governos populares, talvez houvesse também, nesse papel de submissão extrema, o anseio por uma blindagem contra investigações sobre sonegação fiscal e “otras cositas más”.

Porém, o pretérito perfeito talvez não seja o tempo de verbo adequado.

A julgar pela patética entrevista do Roda Viva, boa parte da nossa imprensa ainda é mera porta-voz de “lavajateiros” criminosos.

Porta-voz que tem o desplante de perguntar se Glenn atuou um filme pornográfico.

Pornografia pura.

*******

Para não dizer que me limito ao azedume, tomo emprestado do Luis Nassif algumas perguntas cruciais de que foram incapazes a bancada de entrevistadores e entrevistadoras do Glenn Greenwald, Prêmio Pulitzer de Jornalismo, e candidato a bisar.

Seleciono de seu comentário no Jornal GGN, onde você pode ler a íntegra:

  1. Como se dá a coordenação da cobertura compartilhada para impedir, por exemplo, redundâncias ou conflitos de interpretação?
  2. Quais são as ferramentas de pesquisa utilizadas? Sistema de localização para textos? E no caso dos áudios, como filtrar?
  3. Como foi a operação para colocar o conteúdo a salvo da ação da Polícia Federal e, mesmo, da CIA? Como funcionam os sistemas de nuvens para ficarem a salvo de órgãos de Estado.
  4. O que esperar das conversas gravadas sobre as negociações com advogados de delatores? Qual o nível de intimidade entre procuradores e advogados?
  5. Quais os indícios de interferência de Rosângela Moro e o primeiro amigo Zucolotto nos acordos de delação?
  6. Como foram as conversas sobre a fundação que administraria os recursos da Lava Jato?
  7. Houve conversas com colegas de outros países sobre parcerias em escritórios de compliance para atender empresas denunciadas pela Lava Jato? Há indícios sobre a indústria da anticorrupção?
  8. Qual o grau de intimidade entre Lava Jato e magistrados de tribunais superiores?

Deixo outra:

Como você consegue manter a calma diante de tanta esculhambação!?

Eis o vídeo do programa com Greenwald:

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