Quando o nu desperta os instintos, nem as cadeiras resistem à censura…

por Sulamita Esteliam

A censura, ao que parece, voltou à moda no Brasil. Falo de cadeira, porque este A Tal Mineira está censurado há mais de dois meses. Nas duas redes sociais administradas pelo Zuckberg, o Mark, não se pode compartilhar nada com o link do blogue. Denúncia infundada de “conteúdo inadequado”. Coisa de algum sem o que fazer. Cansei de recorrer, em vão. Larguei para lá.

Pois bem, em Beagá, minha Macondo de origem, está se tornando rotina censurar expressão artística, faz tempo. Antes mesmo de o país descer aos infernos junto com esse desgoverno, que parece ter vindo para nos fazer pagar todos os pecados em vida, e que vê na educação e na cultura ameaças comunistas. Mas agora degringolou.

Desta vez, uma exposição de cadeiras customizadas, digamos assim, foi o alvo da sanha moralista. Coisa de gente tosca, mal-resolvida. Mas gente (?) que ocupa espaços de poder, quaisquer, não importa a monta ou que ribalta.

Uma peça travestida em corpo de homem, em nu frontal, assinada pelo mineiro Breno Barbosa, foi banida da mostra Dança das Cadeiras, organizada e sob curatela do artista plástico Hogenério.

O censor de plantão é a direção do Ponteio Lar Shopping, um showroom de decoração e designer, ora vejam só!

Exigir coerência nessa quadra do Brasil talvez seja um pouco demais.

A cadeira expurgada é uma das mais de cinco dezenas que compõem a exposição, obras criadas especialmente para a exposição por 53 artistas plásticos diversos.

Artistas que não economizaram ousadia em suas criações sobre algo tão prosaico, a transformação de um objeto que é parte do nosso cotidiano em obra de arte.

Naturalmente que a curadoria e a organização não impuseram qualquer tipo de restrição ou condicionamento, e nem faria sentido. A arte deve ser livre ou é outra coisa.

Nas palavras do idealizador, ele próprio um dos criadores:

“Ao dar asas à imaginação, a exposição cresceu e conseguimos extrair o melhor da arte contemporânea com peças incríveis e até algumas pequenas instalações.”

O administrador shopping, porém, foi taxativo: “Sai a cadeira ou não tem exposição”.

Hogenério ainda tentou a saída lateral: buscou uma galeria de arte, no próprio shopping para abrigar a cadeira vitimada.

“Todos artistas ficaram indignados com a situação imposta pelo shopping. Mas, colocar a cadeira na galeria mostra para todos que a arte precisa de liberdade de expressão e que em pleno século XXI não podemos agir dessa forma. O nu não pode ser visto como opressão. Não podemos ter vergonha do nosso corpo, ainda mais de uma obra de arte.”

Mas eis que a inquisição baixou geral, e nesta quarta a direção do shopping mandou a dona da galeria exilar a obra.

Resultado, a mostra, aberta desde 29 de agosto e que deveria permanecer até 19 setembro – e depois ganhar mundo nas Gerais, quiçá no Brasil – foi interrompida. Democratizar o acesso à arte é um objetivo, abortado temporariamente: nesta sexta, todas as cadeiras deixam o Ponteio Lar Shopping, ironicamente um dos apoiadores do evento.

É a decisão coletiva de artistas e curadoria. Não se pode contemporizar com o obscurantismo, com a ignorância, com o grotesco. Censura é inadmissível.

A assessoria da exposição não sabe dizer quando tornará a público. Local já se tem: o estilista Ronaldo Fraga ofereceu seu Grande Hotel para abrigar a mostra.

Resta-nos aguardar e torcer para que seja em breve.

O catálogo oficial da mostra:

E o rol de artistas participantes da coletiva:

Agnaldo Pinho, Ana Paula Costa, Angela Geo, Augusto Fonseca, Beatriz Abi-Acl, Bráulio Bittencourt, Breno Barbosa, Camila Lacerda, Carlos Buere, Carlos Macedo, Cláudia Guerra, Daniel Pinho, Edna Moura, Eduardo Rosa, Eliz Machado Dias, Eri Gomes, Fátima Mirandda, Glaucio Caldeira, Gui Mazzoni, Helder Profeta, Heloísa Brandão, Henio Dutra, Hogenério, Iara Abreu, Igor Reis, Jáder Rezende, João Maciel, José Otávio Lemos, Joseph John, Juarez Dias Costa, Karla Neves, Leo Brizola, Leo Piló, Leonora Weissmann, Letícia Pinto, Lídia Miquelão, Ligia Taka, Lorena Mascarenhas, Luiz Rocha, Marconi Marques, Marcos Palmeira, Marcus Paschoalin, Marina Alves, Nina de Souza-Lima, Nivalda Mendonça, Paulo Vasconcelos, Ramiro Cerqueira, Raquel Isidoro, Robhson Abreu, Rofe Nosbor, Selma Weissmann, Sérgio Arruda e Sérgio Machado.  

Os patrocinadores: Centro de Formação, Estética e Beleza Designer de Sobrancelhas Gislene Ribeiro – o que será que pensam a respeito?

 Apoio: Jornal de Belo Fred iZak Mídia OOH, Viaduto das Artes e Gestalt, além do censor Ponteio Lar Shopping.

 

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