De patifarias, milícias, arroubos e acovardamentos…

por Sulamita Esteliam

Quem muito se abaixa, mostra os fundilhos. O dito popular, em livre tradução, não parece incomodar nosso #TristeBrasil. A capacidade de se reduzir à indiferença ou ao medo acovardado de uma matilha esfomeada de violência, sem um pingo de civilidade, empatia, vergonha na cara e dignidade, parece não ter fim.

O capiroto-presidente atiça, vomita e exala violência e maus odores. Até o Ciro Gomes é capaz de perceber que o que acontece no Ceará – de Sobral a Fortaleza – reflete os humores do – pai meu Pai que decadência!- do supremo mandatário da Nação.

O irmão Cid Gomes, destemperado como quê, senador da República, ministro, governador ou prefeito, foi na onda “cabra macho”, enfrentou os sublevados e levou dois balaços no peito. De boas intenções, quando há, o inferno está cheio.

Escapou, felizmente, vaso ruim não quebra por pouco impacto.

Mas o Ceará não merece tamanho desassossego. Quando não é o Comando Vermelho, é a tropa amotinada, estranhando seus semelhantes, e assemelhando-se às milícias do entorno da trupe famiglia encastelada no poder central e suas vazantes.

Cleber Lorenço, colunista da  Fórum, cravou o termo “intentona bolsonarista”. Perfeito.

Não pode ser mera coincidência que dois estados governados pelo PT sejam alvos de ações milicianas, com e sem farda.

Não, não costumo delirar. Lembra do que Euzinha falei do silêncio do governador da Bahia, e que iam jogar no coloco dele a execução do miliciano dileto dos senhores do laranjal?

Tática militante dos ratos de porão de navio.

Ano eleitoral se presta a a armações de toda sorte. Quem tem memória é capaz de enumerar, cito dois, não, três exemplos:

  • sequestro de Abílio Diniz em 1989, um dos fatores a influenciar a eleição de Fernando Collor (PRN) e a derrota de Luiz Inácio Lula da Silva (PT);
  • dossiê dos aloprados do PT em 2006;, neste caso, tentativa vã de desconstruir o partido do presidente candidato à reeleição, e vitorioso, apesar de também sob o fogo cruzado AP 477, no STF, o dito mensalão que não restou provado;
  • em 2014, sob o signo da Lava Jato, e bloqueio do Congresso, o hoje ex-juiz inquisidor – ora ministro da Justiça taxado como “capanga de miliciano” -, gravou e divulgou telefonema entre a Presidenta da República, Dilma Rousseff, e o ex-presidente Lula. Convidado a ser ministro da Casa Civil, teria importante papel na rearticulação política do governo.

A história só se repete como farsa; cada vez mais elaborada, tacanha apesar de tudo.

Tudo junto e misturado.

Guerra híbrida das boas, me lembra um certo Manoel integrante de grupo comum no zap-zap. Ataques simultâneos, no mais das vezes, com falsidades, fraudes, maquiagens toscas da realidade.

Circula nas redes sociais um vídeo que simula a abordagem de um motorista-homem a uma prostituta em uma calçada de um centro urbano qualquer. Ele quer saber quanto ela cobra, ela responde que depende do serviço, ele diz que quer um furo, ela responde que tem três e ele tem que escolher ou definir, e o homem diz “quero um furo de reportagem”.

Aí a mulher se destempera e pede respeito: “sou prostituta com muito orgulho!”

Sacou?

Não adianta notinhas de repúdio, abaixo-assinados, depoimentos de protesto e apoio diante do embuste ardiloso. Escrevi isso no Instagram, ao comentar vídeo-protesto contra os ataques à colega jornalista da Folha de São Paulo, Patrícia Campos Mello, já referida em postagens anteriores deste blogue.

Estamos cercadas, cercados de mediocridade, cinismo e hipocrisia. Nem por isso podemos nos intimidar.

Não se justifica a pasmaceira e o burocratismo.

Um meliante afronta uma mulher no exercício de sua profissão numa comissão do Parlamento. Hans River – tristemente, um negro – deveria ter saído de lá preso por mentira, injúria, calúnia e difamação.

O Congresso se apequenou. Mas o que dizer de um presidente da República repetir, sob risos, o assédio para o país e o mundo, microfones e câmeras abertos!?

Não há mais brio entre coleguinhas? Em linguagem adequadamente chula, no dos outros é refresco!?

As mulheres de nome e peso, as organizadas em entidades profissionais, no movimento feminista, em partidos políticos, na esquerda, as jornalistas que se prezam, precisam ir além de notas de repúdio. Crime se trata com ação.

É preciso uma campanha cerrada, criativa, objetiva, não só em defesa da dignidade do trabalho das mulheres, mas pela destituição dessa quadrilha cruel, machista, misógina, homofóbica, entreguista, canalha do poder.

Não, não é pelo impeachment que vamos chegar lá, pelo amor! É tudo que os milicos encastelados no Planalto, comendo pelas beiradas, querem: a cadeira presidencial. Daí não largam mais o osso.

Podem rir, mas raciocinem, em qualquer nome ou fé que se lhe apeteça: a eleição presidencial tem que ser anulada, e o TSE tem elementos de sobra para fazê-lo. Esse é o ponto.

É tudo que a famiglia miliciana e seus asseclas de plantão temem – daí o ódio contra Patrícia Mello, que escancarou a fraude do disparo em massa de fake news na campanha eleitoral.

E é em cima do TSE que temos que agir. Eleição anulada dentro de dois anos, podemos voltar as urnas e corrigir o mal pela raiz.

Tá certo, falta combinar com os russos… Mas sem ousadia não chegamos aonde precisamos ir.

A alternativa é ficarmos na janela vendo o terror passar. Renato Aroeira desenha à perfeição, como sempre, “o tamanho do problema” em duas charges geniais, acima e abaixo. Só posso dizer obrigada.

Ou, como sugere diagnóstico do igualmente genial Fernando Veríssimo, em sua coluna no jornal O Globo, desta quinta:

“Apatifam-nos“. Pior, “sem perspectiva de cura”!

Transcrevo, a partir do Tijolaço:

Veríssimo: um país que apatifaram

postado por Fernando Brito – no Tijolaço

Tristemente magistral Luís Fernando Veríssimo, em sua coluna de hoje, n’O Globo:

‘Apatifar”, nos diz o “Aurélio”, significa tornar desprezível, aviltar, envilecer. Pessoas se apatifam, nações inteiras podem se apatifar, ou serem apatifadas. O mundo hoje vive uma assustadora onda de contágio viral que, espera-se, acabará controlada ou, eventualmente, desaparecerá. Já patifaria não mata, mas também contagia, com a diferença de que não tem nem perspectiva de cura.

É impossível observar o Brasil de hoje sem a sensação de estar assistindo a uma pantomima tragicômica, a decomposição de um Estado que, dissessem o que dissessem de governos anteriores — inclusive os lamentáveis —, mantinham, pelo menos, a linha, o que é mais do que se pode dizer da atuação de Bolsonaro & Filhos no palco do poder.

Agora se entende por que Bolsonaro insistia em dizer que não houve um golpe em 64 nem uma ditadura militar nos 20 anos seguintes: ele queria montar o seu próprio regime militar, enchendo o Planalto de generais de fatiota que deixam seus tanques no estacionamento e entram pela rampa principal, rindo da gente. Implícita nessa original tomada do poder está a ideia imorredoura de que só uma casta iluminada, os militares, sabem governar um país.

O apatifamento de uma nação começa pela degradação do discurso público e pela baixaria como linguagem corriqueira, adotada nos mais altos níveis de uma sociedade embrutecida. Apatifam-nos pelo exemplo. Milícias armadas impõem sua lei do mais forte e mais assassino com licença tácita para matar. Há uma guerra aberta com a área de cultura, e a ameaça de um retrocesso obscurantista nas prioridades de um governo que ainda não aceitou Copérnico, o que dirá Darwin. Aumentam os cortes de gastos sociais, além de cortes em direitos históricos dos trabalhadores. Aumenta a defloração da Amazônia. Aumentam as ameaças à imprensa.

E aumenta a suspeita de que na Universidade de Chicago o Paulo Guedes só assistiu às aulas de bobagens para dizer caso a economia não deslanche.

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