Hereda: a ‘essência Divina’ perde seu intérprete terreno

por Sulamita Esteliam

Andei meio fora de sintonia nos últimos dias. Daí que fui tristemente surpreendida ao acessar o sítio eletrônico do ex-presidente Lula e me deparar com a “Nota de pesar pelo falecimento de Jorge Hereda”

Ex-presidente da Caixa Econômica Federal, o arquiteto e urbanista Jorge Hereda foi também secretário de Desenvolvimento Econômico do governo Rui Costa, na Bahia, dentre outras múltiplas atividades no poder público de diferentes níveis. Foi levado pelo câncer, dia 9, aos 64 anos.

Transcrevo a nota de Lula:

“Arquiteto e urbanista, Jorge Fontes Hereda contribuiu de forma decisiva para transformar a vida de milhares de famílias brasileiras e impulsionar o desenvolvimento regional do país.

Sua trajetória como gestor teve início no estado de São Paulo, onde ocupou a Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano de Diadema, foi secretário de  Serviços e Obras de São Paulo, presidente da Cohab e secretário-executivo do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC.

Foi comigo para o governo federal e me ajudou a construir um dos maiores programas habitacionais do mundo, o Minha Casa Minha Vida.

Primeiro, na secretaria de Habitação do Ministério da Cidades e, depois, na vice-presidência da Caixa, Hereda colaborou para beneficiar quase 7 milhões de brasileiros com a casa própria. Já como presidente da Caixa, ele fortaleceu e ampliou o braço social do banco, levando desenvolvimento, saneamento e infraestrutura a todos os cantos do país. Também contribuiu para o estado da Bahia, como secretário de Desenvolvimento Econômico no primeiro governo de Rui Costa (PT).

Foi um companheiro que dedicou a carreira ao serviço público e o fez com grande competência e firmeza. Meus sentimentos e solidariedade aos familiares, aos amigos e companheiros de Jorge Fontes Hereda. 

Luiz Inácio Lula da Silva”

A ex-presidenta Dilma Rousseff, dentre outros companheiros de luta e trabalho, também se manifestou com tristeza: 

“Lamento profundamente a morte do companheiro e amigo Jorge Hereda. Foi meu parceiro e do presidente Lula, fez da Caixa um instrumento eficiente do crédito popular, do Minha Casa Minha Vida e do Bolsa Família. Fará muita falta ao país. Meus sentimentos à sua família e amigos.

Conheci Hereda e o entrevistei em 2014, como presidente vitorioso da Caixa. Deu-se durante o VI Encontro da Aneac – Associação Nacional de Engenheiros e Arquitetos da Caixa, em Aracaju, capital de Sergipe. À época, Euzinha prestava serviços de Assessoria em Comunicação para a entidade.

Uma frase irônica, que soou autocrítica, ficou bem gravada em minha memória: “Os arquitetos são a essência Divina”. A que, na brincadeira, completei: “E os engenheiros são os porteiros do Céu”.

Rimos muito dessa exegese, apesar do atropelo da entrevista, sob a disputa de atenções dos colegas-subordinados, no encerramento do painel em que ele era a estrela; o título sugestivo era “Sala de Visitas”.

Muito afável, combinamos uma exclusiva, que aconteceu, via troca de mensagens através da Assessoria de Imprensa da Caixa. Mas a edição do jornal acabou suspensa por questões políticas da Aneac e, na sequência, por motivos pessoais, deixei de prestar serviços à entidade.

Outra frase, que acabei usando num destaque na edição do jornal da entidade sobre o evento: “A Caixa subiu o Everest”.

Sede da Caixa - BSB
Sede da Caixa em Brasília – Foto: internet

A Caixa ia de vento em popa, de fato. Nunca neste país havia investido tanto em infraestrutura, constatava-se. Depois de duas décadas perdidas, o Brasil resgatara sua capacidade de investimento e pôde se recuperar, em parte, do atraso em relação a outros países.

Nos 11 anos dos governos Lula e Dilma, foram cerca de R$ 1 trilhão e 700 bilhões aplicados na lógica da aceleração do crescimento e da melhoria de vida dos brasileiros, sobretudo das camadas mais vulneráveis: habitação de interesse social, urbanização de favelas e saneamento, drenagem e contenção de riscos, mas também em geração de energia, portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, obras viárias e de mobilidade urbana.

A campanha eleitoral corria solta e a dúvida, não verbalizada, era se a presidenta Dilma Rousseff conseguiria se reeleger após as ditas “jornadas de junho”, protestos cevados pela mídia venal e a nata empresarial e financeira da Avenida Paulista – e movida, soube-se depois, de fora para dentro.

A pergunta que incomodava era o que aconteceria com o Brasil se a reeleição não se viabilizasse. Não se cogitava de golpe, que foi tramado e tornado irreversível, exatamente, a partir da sua reeleição.

Daí que a pauta do encontro colocava em discussão vários desafios, dentre eles, o fundamental, lembrado então pelo presidente da Aneac, engenheiro Mário Viana: como transformar os investimentos sociais e de infraestrutura, operacionalizados pela caixas, em políticas públicas permanentes, não sujeitas à volubilidade do poder, a cada governo”.

O correr da História nos mostra, aqui e agora, o quanto a preocupação de profissionais de engenharia e arquitetura, trabalhadores concursados da Caixa, era pertinente. Sem esquecer que o banco estatal, executor das políticas sociais do governo federal, está sob a mira do desmonte do patrimônio público pelo desgoverno de plantão.

Jorge Hereda - Aneac
Jorge Hereda no VI Encontro da Aneac, em Aracaju

Resgato de meus alfarrábios o texto que escrevi sobre a participação de Jorge Hereda no evento. Transcrevo pela memória dele, mas também para ponto de reflexão do aqui e agora:

A Caixa “subiu o Everest”, diz Hereda

O crescimento da Caixa é superlativo em todos os setores – em volume de ativos, concessão de crédito, expansão de agências, número de funcionários, o que alçou a empresa à condição de terceiro banco do país em três anos.

Fruto, segundo o presidente Jorge Hereda, de “planejamento estratégico, que colocou o banco no lugar que ele merece, na posição que merecemos pelo trabalho que desenvolvemos”.  De acordo com ele, a Caixa cresceu o equivalente a “um HSBC por ano, e um Santander em três anos”.

Muito à vontade na “sala de visitas” do VI Encontro Aneac, Hereda encerrou o evento com uma conversa informal, ao lado do presidente da Associação, Mário Viana. Reconheceu que, para chegar lá, o banco contou com o trabalho de todos e cada um dos cerca de 100 mil funcionários.

Ressaltou a contribuição dos engenheiros e arquitetos da Caixa:  “Queria que vocês soubessem a transformação que ajudaram a fazer nesse país. O trabalho de vocês está envolvido diretamente em políticas públicas, mas também na melhoria das condições de atendimento e de trabalho do banco”, disse, referindo-se ao “profissionalismo” do corpo técnico da empresa.

Manter o patamar e fazer cada vez melhor é o desafio, afirmou o presidente da Caixa, que valeu-se de uma metáfora para descrever a tarefa: “Subimos o Everest, agora vamos criar e cuidar da aldeia. Para manter a sustentabilidade temos que cuidar do crédito para não aumentar a inadimplência, seguir atendendo bem os clientes e usuários, focar na habitação e no governo”.

Em entrevista, o presidente do banco reforçou o grau de responsabilidade e de importância dos profissionais da Caixa no legado das políticas de governo à população. Para ele, a valorização profissional “é fundamental para as pessoas, que precisam ter suas necessidades e habilidades reconhecidas – com boa remuneração e boas condições de trabalho. Isso a gente tem procurado fazer da melhor maneira possível” afiançou.

Hereda mostrou-se comovido com a homenagem que recebeu da Aneac, ano passado em Salvador, durante a X Assembleia Geral: “Carrego com muito orgulho. É muito difícil ser a pessoa que coordena e receber esse carinho, ter essa relação de companheirismo e reconhecimento”.

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Fontes requisitadas:

Lula

Nota de pesar pelo falecimento de Jorge Hereda

A Tarde

Morre Jorge Hereda, ex-presidente da Caixa

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