Gal: divina e maravilhosa estrela

por Sulamita Esteliam

Minha juventude passou acelerada pela minha mente nesta quarta-feira, 09 de novembro de 2022: Euzinha completaria 15 anos no fim de dezembro, quando ouvi e vi pela primeira vez aquela menina baiana, de cabelos encaracolados, roupa psicodélica e voz cristalina, uma oitava acima do humano.

Divina e maravilhosa Gal Costa.

“Atenção, tudo é perigoso,/tudo é divino e maravilhoso./Atenção para o refrão:/é preciso estar atento e forte,/não temos tempo de temer a morte…”

Acompanhada dos Beach Boys, cantar, encantar e  levar o terceiro lugar do Júri Especial, do 4º Festival da Música Popular Brasileira da Record, em São Paulo. O ano da glória era 1968, uma semana antes da decretação do AI-5.

Para quem não se lembra ou fugiu das aulas de História, o Ato Institucional que impôs a censura e o terror da ditadura militar-civil neste país de curta memória.

Gal defendeu a canção de Caetano Veloso e Gilberto Gil, que pouco tempo depois partiriam num rabo de foguete para o exílio em Londres, Maria Bethânia os seguiria.

Gal ficaria – na verdade foi e voltou e aqui, corajosamente, fez defesa solo da Tropicália enquanto durou o exílio dos amigos.

Naquele dezembro de 1968, estávamos todos sentados no chão da sala da casa da minha madrinha Maria, de crisma, em frente ao aparelho de TV, em móvel pés de palito. Os festivais eram o que havia de imperdível naqueles tempos imemoriais.

Isso para quem dispunha de televisão.  Lá em casa, no mesmo bairro do Ferrugem, o Bairro das Indústrias, na região do Barreiro de Belo Horizonte, a TV somente chegaria quase uma década depois.

Mas a lembrança do primeiro encantamento com a menina soteropolitana de cabelos curtos encaracolados – que Euzinha imitaria uma década depois, arriscando uma “permanente” para anelar as madeixas – não veio de pronto.

Foi o maridão que cravou de pronto, quando lhe repassei a questão colocada no Twitter pela colega Cynara Menezes, a Socialista Morena, baiana de geração posterior à de Gal e também à minha.

Das cinco canções listadas, apenas “Baby-1969” se encaixaria para mim como primeira, as outras conhecia todas, mas eram mais recentes, e repassei a dúvida para o maridão.

Ele não vacilou: “Para mim, Divino e Maravilhoso, no Festival da Canção da Record, em 1968”. Bingo! Conferimos: 3º lugar no Júri Especial; Benvinda, de Chico Buarque levou o prêmio do Júri Popular.

O partilhamento é balsâmico. E nunca deixo de me espantar com a memória encicoplédica do Julio para música.

Anos depois, nas festas da turma da faculdade, o sucesso “Tieta” embalou minhas simulações de strip, que tinha meu irmão como discotecário. Era divertido ver a cara dos babões que não conheciam a brincadeira.

“Uma tigreza de unhas negras, e íris cor de mel…”

Mais uma canção de Caetano, em homenagem à Sônia Braga; a eterna Gabriela, cuja canção-tema, do mesmo Caetano, também na voz de Gal, embalou minha primeira gravidez.  Mas carregava um menino…

Gal Costa encantou-se na manhã deste 09 de novembro, em São Paulo, aos 77 anos, quem me contou foi a irmã Eneida da Costa.

Depois corri atrás para mais informações: o velório acontece nesta sexta, de 9h às 15h, na Assembleia Legislativa de São Paulo. O funeral é restrito a familiares e amigos próximos.

A causa da morte não foi divulgada. Recentemente, Gal cancelara dois shows de sua turnê por conta de uma cirurgia de tumor intranasal.

O Brasil ficou mais pobre, e triste.

Fica a voz, inigualável.

Meu nome é Gal!/Me desejo me corresponder com um rapaz que seja o tal/…E não faz mal que ele não seja branco, não tenha cultura, de qualquer altura, eu amo igual”

Fica a ousadia musical e comportamental. Fica o legado de coragem, de mulher livre e libertária, a desafiar o conservadorismo e a hipocrisia tão ao gosto da sociedade brasileira.

Salve, “vaca profana”!

“Respeito muito minhas lágrimas/ainda mais minha risada./Escrevo, assim, minhas palavras/na voz de uma mulher sagrada.

Vaca profana põe teus cornos/pra fora e acima da manada…/Eheheh, dona das divinas tetas/derrama ou leite bom na minha cara/ e o leite mau na cara dos caretas…”

Obrigada, Gal Costa!

Descanse em paz, Maria das Graças Costa. Muita luz para você.

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Rolando Boldrin - Yves Refalo- Divulgação
Rolando Boldrin – Foto: Pierre Yves Refalo/Divulgação

O 9 de novembro levou outra figura da história da música e da cena televisiva brasileira: o ator, cantor, compositor e apresentador de TV, Rolando Boldrin.

Exímio contador de causos, ele tinha 86 anos, completados em 22 de outubro. Teve complicações respiratórias, que o mantiveram internados nos últimos dois meses no Sírio Libanês, em São Paulo.

Nos últimos 17 anos ele apresentou o programa Sr Brasil, na TV Cultura de São Paulo, resgate das tradições da cultura musical brasileira. Programa no mesmo estilo que manteve nas Tvs Globo, Som Brasil; Bandeirantes, Empório Brasileiro; e SBT, Empório Brasil.

Seu corpo será velado no Hall Monumental da Alesp e o funeral acontece no cemitério Gethsêmani Morumbi, às 17h desta quinta-feira.

*com CNN

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contribuicoes 2

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Postagem revista e atualizada em 10.11.22, às 22h26: inclusão de trechos que não foram salvos, devido a quedas frequentes no sistema, enquanto escriva o original.

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