por Sulamita Esteliam
Sexta à noite, a querida professora Bernadete Lage, amiga conquistada no ativismo pelos direitos humanos, me deu a honra de um convite para jantar em sua casa – um peixe delicioso, que ela própria fez.
A certa altura da conversa, da qual participava um mestrando de História, Rômulo Marcolino, que também milita na causa, o assunto foi o papa Francisco, sua humanidade, e o crucifixo que recebeu de presente do presidente Evo Morales, que impõe a cruz sobre uma escultura que agrega a foice e o martelo, símbolo do comunismo.
A mídia venal quase pira.
Tive que confessar que a mim as atitudes do papado de Francisco surpreendem. Já o fiz, aqui mesmo no blogue, mas não me canso de dar a mão à palmatória. Fui crítica ácida quando da sua escolha. E desconfiei quando optou por tornar-se Francisco, em louvor ao santo de Assis, que pregou a humildade, a caridade e o amor aos bichos de Deus, homem incluso.
Errei, sim. Ainda que ele seja um excelente estrategista da comunicação, habilidade que a igreja andava carecendo para recuperar terreno nos corações dos crentes.
Viva Francisco!
Pois que em sua recente visita à Bolívia, o papa tornou a manifestar-se, com vigor, contra a concentração da mídia. A imagem acima resume a primeira fala dele, a respeito, num encontro com rádios católicas, em março do ano passado. Capturei no Twitter do mineiro @Turquinho, de novo.
Desta vez, Francisco falou no Encontro Mundial de Movimentos Populares, em Santa Cruz de la Sierra. Ele também acusou os efeitos do monopolismo sobre a qualidade da informação, sobre a verdade. E voltou a enfatizar o impacto perverso da manipulação sobre a vida das pessoas, das nações, sobretudo as mais pobres – gente e países. Referiu-se ao capitalismo como uma “ditadura sutil”.
O amigo Altamiro Borges, jornalistas e blogueiro “sujo”, que presidente o Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé – que nos abriga a todos – escreve a respeito. Vale à pena ler. Luiz Carlos Azenha também enfoca o assunto no Vi o Mundo.
Transcrevo de Borges no Blog do Miro:
Papa critica concentração na mídia
por Altamiro Borges
A visita do papa Francisco à Bolívia nesta semana deve ter desagradado os barões da mídia. Não é para menos que vários veículos tentaram desviar a atenção destacando o factoide do “crucifixo comunista” dado de presente ao pontífice pelo presidente Evo Morales. Num dos discursos mais incisivos do seu papado, ele disse: “A concentração monopolista dos meios de comunicação social que pretende impor padrões alienantes de consumo e certa uniformidade cultural é outra das formas que adota o novo colonialismo. É o colonialismo ideológico. Como dizem os bispos da África, muitas vezes pretende-se converter os países pobres em ‘peças de um mecanismo, partes de uma engrenagem gigante'”.
No seu conjunto, o discurso do papa foi bastante enfático. Ele tratou da mídia ao abordar as variadas formas do colonialismo na atualidade. “Às vezes, é o poder anônimo do ídolo dinheiro: corporações, credores, alguns tratados denominados ‘de livre comércio’ e a imposição de medidas de ‘austeridade’ que sempre apertam o cinto dos trabalhadores e dos pobres… Noutras ocasiões, sob o nobre disfarce da luta contra a corrupção, o narcotráfico ou o terrorismo – graves males dos nossos tempos que requerem uma ação internacional coordenada – vemos que se impõem aos Estados medidas que pouco têm a ver com a resolução de tais problemáticas e muitas vezes tornam as coisas piores”.
Esta não é a primeira vez que o papa Francisco crítica a mídia monopolista. Em março de 2014, ele já havia apontados alguns “pecados” da imprensa. Numa audiência para as emissoras católicas da rede Corallo, o pontífice afirmou: “Hoje o clima midiático tem suas formas de envenenamento. As pessoas sabem, percebem, mas infelizmente se acostumam a respirar da rádio e da televisão um ar sujo, que não faz bem. É preciso fazer circular um ar mais limpo. Para mim, os maiores pecados são aqueles que vão na estrada da mentira, e são três: a desinformação, a calúnia e a difamação”.
Naquela ocasião, a mídia internacional e nativa também abafou as críticas do papa. Como ele mesmo havia realçado, um dos maiores “pecados” da imprensa é a desinformação. “A desinformação é dizer as coisas pela metade, aquilo que é mais conveniente. Assim, aquele que vê televisão ou ouve rádio não pode ter uma opinião porque não possui os elementos necessários”. Agora, novamente, jornais, revistas e emissoras de rádio e tevê ofuscam suas reflexões mais profundas e destacam apenas alguns factoides. Se existir inferno, os barões da mídia já terão o seu lugar reservado ao lado do capeta!
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PS1: Devo desculpas pela ausência do blogue nos últimos dois dias: o dia ficou curto. Agradeço a compreensão. E vamo que vamo…
PS2: postagem revista e atualizada às 23:22: correção da troca de letras que resultou em erro de concordância verbal na primeira linha do quarto parágrafo da introdução: “surpreendem” e não “surpreendeu”.

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