por Sulamita Esteliam

Que a renúncia de Eduardo Cunha da presidência da Câmara dos Deputados é uma manobra que visa salvar seu mandato e garantir foro privilegiado para julgar suas falcatruas, até as areias da Praia de Boa Viagem sabem.
Se vai funcionar, já é outra história.
É certo que a renúncia tem as digitais de Temer. O manobrado golpista quer locupletar-se. Afinal, deve o cargo provisório à ação deliberadamente vingativa de Cunha contra a presidenta Dilma e o PT, no que diz respeito ao acatamento do processo de impedimento.
A presidenta legítima, afastada enquanto corre o processo no Senado, não se manifestou sobre a atitude “renuncista” do seu algoz. Todavia, memes com Dilma se divertindo com a situação pipocaram nas redes sociais, implacáveis.
Claro que é do interesse do interino usurpador que a direção do Legislativo, ainda que para um mandato tampão – até fevereiro de 2017, quando termina legislatura em curso -, caia em mãos mais confiáveis. Para Temer e seu desgoverno, que é o próprio Cunha, naturalmente.
Daí a proposta resultante do encontro na calada da noite de um domingo recente passado, no Palácio do Jaburu. Tipo: “Eu lhe ajudo, você me favorece com a renúncia”.
Afinal, a instabilidade de Waldir Maranhão, que votou contra o impeachment de Dilma, e agora aceitou o pedido de impeachment de Michel Temer, não ajuda em nada.
O novo presidente da Câmara será eleito na próxima terça-feira, 12, por decisão do Colegiado de Líderes, que antecipou-se ao prazo de cinco sessões, conforme o regimento. Candidaturas devem se apresentar até o meio dia da própria terça.
O jogo está posto. Façam suas apostas.
De volta ao Cunha, há quem diga, que o relatório favorável a Cunha na Comissão de Constituição e Justiça, acatando a hipótese de “má condução” na Comissão de Ética que aprovou a cassação do deputado, faria parte do “acordão”.
Mas isso é detalhe. Dificilmente o colegiado acompanhará o voto do relator, que, entretanto, amealhou cargos para correligionários no governo golpista. É assim que a banda toca.
Assim, manobras diversionistas à parte, o pedido de cassação vai a plenário, mas só após o recesso parlamentar.
Quem vivencia o dia a dia no Parlamento diz que, ainda que seja agosto, o ex-todo-poderoso presidente da Câmara não escapa ser cassado.
Sem foro, pode ser preso, e sentir-se muito à vontade para botar a boca no trombone e delatar deus e o mundo que tenha dividido com ele as benesses furtivas do poder.
A conferir.
De qualquer forma, ex-presidente da Câmara, os processos nos quais Cunha é réu não serão mais julgados pelo plenário do STF. Caem na 2ª Turma da Corte, que é presidida por ninguém menos do que Gilmar Mendes, o ministro-militante-tucano.
Daí que o almoço-reunião esta semana também explica a decisão da renúncia, negada reiteradamente desde seu afastamento da Câmara por ordem do Supremo.
Enquanto isso não acontece, o melhor da festa é ver Eduardo Cunha pagar de sensível, embargar a voz e simular choro. Puro teatro de manipulador, atributo em que, não tenha dúvidas, o deputado é mestre.
Concordo com Paulo Nogueira, do DCM: não se pode comemorar a renúncia de Cunha, porque “ele deveria estar preso há muito tempo, tais e tantos são os seus crimes”. Sua liberdade nos ofende e nos humilha.
O cassino Brasil não dispensa o circo, e a pantomima segue à larga.

Em tempo: a Fórum listou os projetos e medidas controversas aprovadas sob a direção de Eduardo Cunha. Relembre – com os links das matérias publicadas pela revista sobre os temas:
- Votou o projeto de redução da maioridade penal:
Após manobra de Cunha, Câmara aprova redução da maioridade penal para crimes hediondos - Aprovou projeto de shopping na Câmara, o “parlashopping”:
Cunha aprova projeto para construir ‘shopping’ na Câmara no valor de R$ 1 bilhão - Aceitou pedido de impeachment contra a presidenta Dilma como retaliação ao governo, que votou contra o parlamentar no Conselho de Ética:
Cunha desmoraliza o processo de impeachment - Com manobra, texto que aprova terceirização é aprovado:
Texto-base do PL da terceirização é aprovado na Câmara dos Deputados - Autor do projeto de Lei aprovado na CCJ que dificulta o aborto em casos de estupro:
Pílula fica, Cunha sai”: A mobilização de internautas contra o PL de Eduardo Cunha - Desarquivou e aprovou em comissão o projeto do “Estatuto da Família”:
Ativistas se mobilizam nas redes contra Estatuto da Família