
por Sulamita Esteliam
Se é uma coisa que mexe com o meu fígado, mais do que cachaça e comida ruins, é mulher sem noção do seu poder.
Não me refiro ao rebolado nem ao calor e odor que detemos entre as pernas ou mesmo à capacidade de gerar vidas, embora também. Falo do papel que, a despeito da repressão histórica, em todos os matizes, exercemos no destino da coletividade – para o bem e para o mal.
Por isso, a culpa é sempre da mulher. Não é assim que acontece!?
E às vezes, de fato o é, para felicidade e infelicidade geral da nação, no presente e no futuro.
Dias passados, voltava da caminhada quando avistei uma avó levando a neta para a escola. Meu ouvido de tuberculosa captou a conversa:
– Menina brinca com menina. Menino com menino, entendeu!?
Devo ter feito uma das minhas caras de espanto e negação, pois no momento em que nos cruzamos na calçada, a menina esboçou um sorriso e piscou para mim. Provavelmente me devolveu a mensagem que instintivamente lhe passara.
Faço isso o tempo todo, é da minha natureza.
E me derreto de orgulho quando vejo minha netinha de 2 anos se insurgir no mundo de adultos, e maioria masculina, onde cresce, com uma audácia, destreza e independência espantosas para sua idade. Sob a proteção dos Anjos.
DNA é coisa séria.
Quem acessa este blogue, e se dá ao trabalho de ler o que Euzinha escrevo, sabe que passar pano, no sentido de esconder a sujeira, não é minha especialidade. Ademais, odeio hipocrisia e abomino covardia.
Não me conformo, por exemplo, que mulher tenha sido capaz de votar no capiroto; muito menos em nome de Jesus, da moral e dos bons costumes.
E está aí a realidade que não me deixa mentir. Nos transformamos num circo de horrores, de escatologia, com voto bem quantitativo das mulheres.
A mim não importa que elas tenham querido agradar seus parceiros, seus pastores, a memória de seu pai, sua mãe, seu avô. Ao Papa (e aqui cabe maiúscula) que atende pelo codinome de Francisco, sei que não foi.
E não posso crer que elas tenham escolhido, ou deixado de escolher, por convicção. Opinião é direito, autoestima é conquista, mas burrice ninguém pode dela se orgulhar.
A mulher gera, pare, cuida, educa. Cabe a ela quebrar os grilhões que a mantém presa nas tradições e maldições que a sufocam – a começar pela reprodução das gaiolas, de gravetos, plástico, silicone ou de ouro.
Sei bem que algemas interiores são mais difíceis de romper. Trabalho nisso desde criancinha, e vou morrer devendo.
Mas é preciso quebrar o contrato, me ensinou a terapeuta que me salvou de colocar na minha prole a culpa por não conseguir me livrar do pai deles. Pastei algum tempo minhas inconsistências, até que me livrei.
A gente não tem que repetir a história de nossas mães, muito menos a de nossos pais. Mulher que se preza, se ama em primeiro lugar – para conseguir ir à luta e amar-se para sempre. Só assim dá conta do recado de carregar a culpa do mundo.
Experimente ligar o foda-se, é uma maravilha. Depois pague o preço, nada é de graça. Vá a luta, não é fácil, mas o prazer da libertação é inigualável. Mas não faça de sua filha, de seu filho, armas para reproduzir as correntes que lhe oprimiram.
A vida é um presente, uma benção. Viva e deixe viver.
Olhe ao redor, compadeça-se com a miséria alheia, conheça a história de mulheres que fizeram diferença na História. Sobretudo, lembre-se que que seu umbigo não é o centro do Universo, mas o princípio do caminho para o mundo.
Reconheça suas iguais, junte-se a quem vale à pena, seja feliz e ajude a fazer História.
Dia 8 de Março, pare tudo, não porque é domingo, e apesar de. O mundo sem mulheres não existe nem se move.
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Veja aí a programação dos atos do 8M nas minhas Macondos, pois o pai Google não me levou a outras plagas. Clique para anotar:
- No Recife e Pernambuco afora, programação se encerra com manifestação na segunda, 9 – dia de trampo, faz sentido – com passeata saindo do Parque 13 de Maio, às 16:30: agenda via Brasil de Fato
- Em Beagá, o foco é o combate à violência contra as mulheres, e a marcha respeita a data, no domingo, 8, com concentração na Praça Raul Soares, a partir das nove da manhã. Baterias dos blocos femininos do Carnaval presentes. Confira, via BHAz.
Fecho com o clip excelente das Catarinas convocando a mulherada de todos os brasis, olhai!:
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Verdade, Lair, o blogue está sob censura no Facebook e no Instagram desde 25 de abril de 2019. Já cansei de recorrer, em vão. O jeito é mudar o domínio do A Tal Mineira, acrescentando algo. O compartilhamento só pode ser feito copiando e colando o texto e postando fotos e vídeos. Isso a ajuda a denunciar a censura. Mas obrigada pela visita e comentário.