por Sulamita Esteliam
Iniciamos uma semana decisiva para as possibilidades de resgate da vergonha nacional. E, portanto, do esforço individual e coletivo na conjugação do verbo esperançar de que nos fala Paulo Freire, o mestre dos mestres.
Na quarta-feira, 20, já com adiamento, está prevista a leitura do relatório da CPI do Genocídio, que vazou ao Estadão antes da conclusão dos trabalhos. Falta ouvir familiares de vítimas, o que acontece nesta segunda e terça-feiras. A votação está marcada para o dia 26.
Do que se sabe, o relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), confirma que vai imputar ao capiroto-presidente e sua equipe de desgoverno a acusação de que “agiram de forma dolosa”, intencional, na condução da pandemia.
São, portanto, responsáveis pela morte de milhares.
Há no rol das acusações, apontadas nas mais de mil páginas do relatório, 11 crimes. Dentre eles, homicídio qualificado, atribuído ao inominável e ao seu ministro da Saúde mais longevo, Eduardo Pazuello.
São 71 pessoas relacionadas para indiciamento: além do presidente da República, ministros e agentes públicos, também os filhos do capiroto, parlamentares, empresários e médicos, dentre outros.
Não há consenso sobre a acusação de genocídio no núcleo duro da CPI, o chamado G7. E não falta sequer anúncio de relatório paralelo, por esses e outros dissensos.
O relatório vai ser encaminhado à PGR, a quem cabe oferecer denúncia, no caso, ao STF, dadas as prerrogativas presidenciais, ministeriais e parlamentares de parte dos acusados. A comissão não tem poderes punitivos.

Há de se convir: tudo que este país consegue piorar em matéria de crueldade e alienação de que o ser humano é capaz aflorou nessa pandemia.
A marca da besta se traduz na superação de 603 mil mortos desde março de 2020, início da disseminação da peste em Pindorama.
Mais de seis centenas de milhares de vidas e histórias consumidas pelo descaso, irresponsabilidade, pela ganância e malversação do dinheiro público.
Aliás, muito bem traduzida na charge “Trânsito Pesado”, vencedora do 43º Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Aistia e Direitos Humanos. Parabéns ao autor Zé Dassilva, que publica no Diário Catarinense e no NSC.
Não é para qualquer um, mesmo para quem acredita e se submeta, sem questionar lógica, razão e procedimentos, aos desígnios que seriam divinos e/ou carmáticos.
Se isso não é genocídio, carece de se inventar uma definição.
O papel do Estado é cuidar para que seu povo tenha vida digna e bem-estar, sem distinção de classe, etnia, cor, gênero, credo. A isso se chama governar.
Certo é que, ao fim e ao cabo, se encerra a saga do que acabou não sendo a CPI do Fim do Mundo, como esta reles blogueira vaticinou. Não ficou longe disso, todavia.
Escancarou a tampa do esgoto da Caixa de Pandora e nos mostrou que o desgoverno consegue ser mais destrutivo, sádico, nojento e imoral do que nos conta a literatura política ao longo da história humana.
Um convescote de interesses familiares e do mercado financeiro e da caserna. Verdadeira desinsteria, sem meios de contenção.

Não obstante, no que toca ao caso vendido como escabroso da Prevent Sênior, há controvérsias trazidas à tona pela divulgação exclusiva, pelo Jornal GGN do dossiê que seria a prova guardada a sete chaves pelo relator da CPI.
Em análise minuciosa que leva o título de “Xadrez da empresa que matava os clientes para economizar”, a mesma que é acusada de cunhar a máxima de que “óbito é alta”, o colega Luis Nassif mostra que não é bem assim.
Sobretudo, aponta o massacre de reputação costumeiro no jornalismo nativo, sem questionamentos ou busca de provas. Nos moldes da cobertura da Lava Jato e outros escândalos do passado – casos Escola de Base e Alcenir Guerra, por exemplo – engolidos e amplificados sem elucidação dos fatos.
Nassif escrutina todos os pontos do relatório preparado pela advogada dos oito médicos denunciantes do Prevent Senior. Aponta as falhas e o que considera engodos travestidos de provas, aceitos pelos senadores da CPI e espalhados pela mídia viciada em punitividade.
Sem eximir os gestores do plano de saúde da responsabilidade da omissão, escreve ele:
“O crime da Prevent não foi prescrever um medicamento de eficácia não comprovada, com acompanhamento médico, em uma epidemia em que não havia nenhum medicamento de eficácia comprovada identificado. Quando a politização explodiu, a Prevent Senior simplesmente se recolheu, deixou de divulgar seus estudos. E, calando-se, consentiu que o bolsonarismo utilizasse o tratamento como arma anti-vacina (sic).
Este é o crime – e não é coisa pequena. É falta gravíssima sim, e por ela terão que responder não a empresa Prevent Senior, nem o Conselho Federal de Medicina, as associações de médicos pró-cloroquina, mas as pessoas físicas por trás das (in)decisões.
Um dos álibis mais frequentes para essas campanhas de linchamento é o mote, “ele errou assim, logo não faz mal acusá-lo de ter errado assado”. Acusar alguém de algo que não fez, a pretexto de outros malfeitos que ele fez, continua sendo mentira, notícia falsa, anti-jornalismo (sic).
Mesmo porque, a qualificação correta dos erros é fundamental para impedir as jogadas que sempre se escondem por trás da caça ao Judas do momento.”
O jornalista vai além em seu xadrez da ineficiência jornalística x interesses do mercado de planos de saúde em mascarar a própria ineficiência, e lucrar com ela, na medida em que serve ao supremo deus mercado financeiro que estendeu suas garras ao setor:
“Tentando estabelecer um mínimo de discernimento nessa batalha sem heróis, em que os bruxos querem queimar as vacinas, e os inquisidores pretendem queimar os bruxos:
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- Receitar hidroxicloroquina, com acompanhamento médico, não é crime, mesmo se houver dúvidas sobre sua eficácia. Ainda mais se for ministrada com acompanhamento médico, impedindo seu uso por pacientes com comorbidades. Praticamente todos os grandes hospitais e planos de saúde recorreram a tratamentos alternativos – a maioria, com os medicamentos adotados pela Prevent – por absoluta falta de alternativas.
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- Estimular a venda maciça de hidroxicloroquina, e a automedicação, é crime.
- Não se usa a hidroxicloroquina para economizar custos, a não ser que se acredite em seus poderes curativos.
- Utilizar a hidroxicloroquina para combater vacinas e medidas de prevenção, é crime.
- Afirmar que um plano de saúde mata pacientes para redução de custos é terraplanismo.”
Confira a íntegra da análise e o próprio relatório no portal do GGN.
Vale à pena ler, também, postagem anterior, no final de setembro, em que Luís Nassif disserta, a propósito do depoimento do médico Pedro Benedito Batista Júnior, diretor da Prevent na CPI: Xadrez da grande guerra comercial dos planos de saúde .
Assim, retomamos, após uma semana de ausência: por conta de restrições motoras, tendinite, e psicológicas, baixo-astral. Está difícil manter a serenidade diante do caos, daí o respiro.
Sei que compreendem. Vamos em frente.
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Postagem revista e atualizada dia 19.10.2021, às 19:41: correção de erros de digitação, ortografia e pontuação.