por Sulamita Esteliam
Não se pode fugir de notícia ruim, pelo menos não o tempo todo. Quanto mais quando se está no Brasil desgovernado pela milícia: a informação do dia, confirmada pela esposa do jornalista Dom Phillips, é de que os corpos dele e do indigenista Bruno Pereira foram encontrados. A Polícia Federal nega.
Certamente cumpre ordem do Coisa-Ruim, que segundo o Tijolaço, já deu pinta na CNN que sabe das “maldades” a que ambos foram submetidos. Quer protelar, para amortecer a indignação, que é internacional.
Dom e Bruno desapareceram no domingo, 5 de junho, no rio Itacoaí, região do Vale do Javari, extremo oeste do Amazonas, na fronteira com o Peru.
Bruno era conhecido na região pois chefiou a Funai, de onde foi exonerado pelo governo federal – leia-se Sergio Moro ministro da Justiça -, por fiscalizar com rigor a pesca e o garimpo ilegal, e por defender os povos indígenas. Últimamente, assessorava organizações dos povos da região.
Ele, que também era jornalista, ciceroneava o jornalista inglês, que investigava tais ilegalidades cometidas à floresta Amazônica e a invasão de terras indígenas para escrever um livro.
De acordo com o The Gardian, jornal para o qual Dom trabalhava, parentes do jornalista afirmaram que a embaixada brasileira em Londres os contatou para informar que dois corpos, ainda não identificados, foram encontrados amarrados em uma árvore.
O que indica que foram torturados. Daí a fala do inominável de que “algo perverso” teria sido feito a eles. Tipo: o gato subiu no telhado…
Como se fosse possível reduzir o impacto de uma barbaridade desse calibre.
Sem esquecer que é o discurso de ódio e descaso reverberado por quem, em tese, é a maior autoridade do país, que estimula a ilegalidade e a selvajeria em todo o país, quando mais numa terra que costuma fazer suas próprias leis.
No sábado, uma semana após o desaparecimento do jornalista e do indigenista, foram encontrados objetos que seriam seus pertences. Estavam em uma área alagada da floresta e foram localizados por uma equipe de busca organizada pelos indígenas, afirma o jornal britânico.
Ainda segundo o periódico, enquanto o inominável falava em entrevista suas impressões sobre o desaparecimento da dupla, indígenas do Vale do Javari “marchavam” em Atalaia do Norte, o lugar onde ambos embarcaram para o que deveria ser uma reportagem de quatro dias no interior da floresta.
Os manifestantes indígenas exigiam justiça para Bruno e Dom e denunciaram o ataque sistemático à floresta e às terras ancestrais.
Aqui é pertinente questionar: para que serve mesmo o Exército brasileiro, além de se locupletar com salários estratosféricos picanha, salmão, viagra e lubrificante íntimo?
PS: Em longo e dolorido artigo publicado no Nexo, a colega Eliane Brum, que vive em Altamira com o marido e também jornalista inglês, Jonathan Wats, editor global do The Guardian, denuncia a desinformação e a deliberada e demasiada demora em iniciar as buscas pelos desaparecidos: “Não é incompetência nem descaso, é método”.
Diz mais:
“O desaparecimento de Dom e Bruno é apenas a mais recente violência na Amazônia aprisionada neste país a que chamamos Brasil, governado por um defensor da ditadura, da execução e da tortura chamado Jair Bolsonaro. Estamos em guerra. E afirmar isso não é retórica.”
É muito triste, indigno e revoltante o que vivenciamos neste país.
Há que se exigir rigor nas investigações e transparência nas informações. Há um pescador preso preventivamente: um certo “Pelado” que teria ameaçado a dupla quando pego em flagrante de pesca ilegal. No barco dele havia vestígios de sangue.
Em ampla reportagem que o GGN reproduz, a Amazônia Legal conversa com as últimas pessoas que tiveram contato com o indigenista Bruno, alguns tidos como suspeitos de estarem envolvidos com o desaparecimento do indigenista e do jornalista.
A matéria levanta a suspeita de envolvimento do “narcotráfico” no crime hediondo que, a essa altura não resta dúvida, tirou a vida de dois humanistas.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, determinou às comissões de Constituição e Justiça, Meio Ambiente e Diretos Humanos e Cidadania, acompanhem de perto as investigações.
Mas a pergunta que não quer calar é a mesma que há mais de quatro anos se faz sobre a morte de Marielle e Anderson, no Rio de Janeiro. Agora são quatro famílias e estado profundo de dor, e toda a sociedade brasileira, e o mundo à espera da resposta: quem mandou matar?
Que se faça justiça para os mortos descansarem em paz.
O vídeo abaixo circula nas redes sociais e se tornou viral. Mostra Bruno Pereira, feliz, cantando uma canção em idioma indígena, um dos muitos que ele dominava muito bem:
Fontes requisitadas:
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Postagem revista e atualizada em 14.06.2022, às 7h54: correção de erros de digitação, repetição de palavras e supressão de frase introdutória do vídeo ao pé da postagem; inclusão de informações sobre Bruno Pereira e trecho e link de artigo de Eliane Brum, no Nexo, e dos links do Tijolaço do G1.
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