por Sulamita Esteliam
Natal, para mim, sempre carrega a alegria de ter fé na vida. Agora ainda mais, quando adquirimos a chance de voltar a ser feliz.
Mesmo quando a maré teima em desmanchar os sonhos da grande noite de verão, aqui nos trópicos. Teimar e navegar é o mantra de quem faz do luto verbo.
A transição para o novo tempo carrega as dificuldades da terra revirada pela praga que impera, há seis anos, pelo delírio do caos incessante. Acabou, por mais que tentem perpetuar o jogo de faz de conta.
Quem chega traz na bagagem a vontade de acertar, o compromisso de refazer e a garra que faz acontecer. É o que importa.
O astral é de recomeço, o futuro é logo ali e a gente constrói. E tudo cessa quando um valor maior se levanta. Lugares comum que traduzem a realidade.
Gosto do rito da festa de Natal, mesmo em anos de bancarrota. Preparar a casa para celebrar o novo ciclo, faxinar os cantos, gavetas e armários; passar adiante o que não se usa e pode ser útil a alguém, repartir o pão e o que vai além do necessário.
Desembrulhar e limpar a árvore de cipó, há um ano guardada no canto do armário do quarto de serviço, é parte do ritual. Separar os enfeites que restaram do acumulado e repartido ao longo de uma vida inteira…
Enrolar o fio de luzes e torcer para que funcione o pisca-pisca de anos passados; a experiência a alimentar o alvorecer de novos dias.
Armar o presépio é tarefa que sempre me coube desde os 7 anos: uma faina que envolvia encerar o alinhagem com grude e mistura de carvão com vidro moído e seixos esmigalhados para armar a gruta num canto da sala. Hoje a tarefa é mais simples e tudo cabe na mesinha lateral.
Do presépio antigo ainda restam dois reis, o pastor e a ovelha, que restaurei recentemente. O trio de visitantes este ano é completado por um boneco de Lampião.
Afinal, o Nordeste, definitivamente, está por cima da carne seca. Deu ao Brasil o primeiro presidente retirante da História deste país, e o único a ser eleito por três vezes, mesmo depois de ser perseguido, achincalhado, condenado sem provas e preso.
Uma história de vida que se cruza com a do menino da Galileia: ambos pobres, filhos da periferia do mundo, perseguidos porque seriam “ameaça” aos poderosos de plantão.
Um, filho de mãe solteira, com um pai adotivo; outro filho de mulher abandonada, carregada de filhos, criado sem pai, sem oportunidades que não a do trabalho duro, desde tenra idade, na terra para onde a família migrou.
A família de Jesus também teve que se refugiar, para garantir a vida do menino. E ele, ainda garoto, de volta à sua terra, aprendeu com José o ofício de carpinteiro, antes de iniciar o périplo de pregador.
Ambos escolheram servir ao povo a que pertencem: fizeram a opção preferencial pela gente pobre, a sua gente; papeis essencialmente políticos. E isso lhes garantiu, por um lado admiração; por outro a privação da liberdade e, no caso do Nazareno, a vida do homem feito Deus.
Esses pontos de contato, sem qualquer tentativa de sacralização da figura de Lula, foram bem dissertados por dom Hélder Câmara, arcebispo Emérito de Olinda e Recife. Tomo emprestada de publicação do colega pernambucano, Geraldo Bringel, e compartilho:

Feliz Natal! Feliz subversão!
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