por Sulamita Esteliam
O amigo Nísio Miranda, poeta das Gerais – e companheiro de lutas políticas, pela cidadania e pelos direitos humanos -, gentilmente, envia para publicar no A Tal Mineira. Muito obrigada.
As notícias do inicio da noite desta segunda-feira são de que há três corpos identificados até agora, todos de trabalhadores da mina, vítimas do rompimento das barreiras com rejeitos de mineração em Bento Rodrigues, distrito de Mariana., quinta feira, 05.
Oficialmente há 25 pessoas desaparecidas, 15 das quais, moradores região. O Corpo Bombeiros conta 612 desabrigados, instalados em hotéis da região. Ainda não se conhece resultado da análise sobre a toxidade dos rejeitos.
Há grande clamor popular pela definição das responsabilidades e pelo acesso da população ao centro de operações e resgate que, segundo consta, funciona intra-muros da empresa.
Aliás, parece que o governador Pimentel está com sérios problemas de senso de oportunidade: onde já se viu dar coletiva de imprensa na sede da empresa causadora, por bem ou por mal, de tamanho desastre!?
Sim, por que custa-me crer que possa ter sido orientação da assessoria política e de comunicação. Francamente!
Em situações como tais, não basta ser correto e previdente. Tem que estar sensível e mostrar sensibilidade.
Botar o pé na lama de vez quando faz bem.
Menos mal que hoje, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente embargou as atividades da mineradora Samarco até apuração das causas do acidente.

Auto de Desagravo a Bento Rodrigues
Nísio Miranda*
A alma de Minas
está soterrada.
A alma dos Gerais
está enlameada.
Como repletos de lama
estão meus ouvidos,
minhas narinas,
minha boca,
meus olhos,
meus pulmões,
as estradas.
Limpa, apenas a
consciência
dos omissos.
Imaculada, apenas
a imprevidência
dos impunes
desse e de outros
crimes de mesma
– ironicamente – lavra .
desse e de outros
crimes de mesma
– ironicamente – lavra .
À extensão ampliada
das crateras,
ao crescimento
desmedido dos buracos,
a inversa proporção
ao cuidado,
a ínfima preocupação
com o todo,
e a percepção inflada
do lucro.
Ah, sagrado solo
dessas Minas!
Ah, indispensável água
dessas fontes!
Ah, vidas ceifadas
por essa sina
de ser apenas riqueza,
– mero recurso –
aos olhos
insensíveis dos
que investem
e às burras eleitorais
dos que governam!
E dos que, incautos,
esperam sempre o
tempo da solidariedade,
e a exercem como se se
redimissem
da ausência de convicção
e seriedade
com que deveriam
exercer suas escolhas.
Que dobrem os sinos
de Mariana, de Ouro Preto,
de Congonhas, de Nova Lima,
de São Gonçalo, do Mato Dentro,
de Sabará, de Santa Bárbara!
Que dobrem, de Minas, todos sinos!
Pelas mulheres, pelas meninas,
pelos homens, pelos meninos,
por suas almas, por seus destinos,
Dobrem, dobrem, de Minas, todos os sinos!
Que dobrem, de Minas, todos os sinos!
Pelos que dormem, pelos que sonham,
pelos poderosos, pelos pequeninos,
pelos que choram, pelos de antes,
pelos de hoje, pelos que virão…
Pelas panelas, ora silentes.
Dobrem, dobrem, sinos de Minas!
Pelos eleitos, pelos esquecidos,
pelos atingidos, pelos que não viram,
pelos ungidos, que aqui não vivem
mas sofrem, solidários e melancólicos,
a dor planetária de Gaia ferida
Dobrem, dobrem, de Minas, todos os sinos!
Sinos ironicamente fundidos
da mesma matéria,
da mesma omissão,
da mesma inconsequência,
da mesma hipocrisia.
da mesma irresponsabilidade
do mesmo vil metal
que, per saecula saeculorum,
cruelmente, nos soterram,
impunemente, nos assolam.
*Nísio Miguel Tôrres de Miranda – Bel. em Direito, Especialista em Direitos Difusos e Coletivos, poeta e ambientalista.

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