
por Sulamita Esteliam
Aquarius, o filme do pernambucano Kleber Mendonça Filho, que já é história, estreia no Brasil, no 1º de setembro. E o faz sob polêmica. O desgoverno temeroso cravou-lhe a censura para menores de 18 anos.
Não é apenas ridículo, é indigno. Usa a censura para retaliar a postura política da equipe de Aquarius! Em Cannes, onde competiu na seleção oficial do Festival que é puro charme, diretor e atores abriram cartazes de protesto contra o golpe no Brasil.
Eis algumas das frases expostas para o mundo, a partir do tapete vermelho de Cannes.
“Misóginos, racistas e golpistas como ministros.”/”Brasil está experienciando um golpe de estado.”/ “54.501.118 votos incendiados.”/ “O mundo não pode aceitar este governo ilegítimo.”
O filme deixou o festival ovacionado e sob elogios da crítica especializada.
Kleber Mendonça é diretor premiado. Seu filme O Som ao Redor, também ambientado em Boa Viagem, foi eleito o melhor filme brasileiro do ano em 2013 no 40º Festival Sesc de Cinema, em São Paulo; Rio (Melhor Filme e Roteiro), Gramado (Melhor Som, Filme da Crítica, Filme do Público e Diretor), Salvador (melhor filme). E mais uma dezena de prêmios em festivais internacionais como Roterdã/Holanda, Instambul/Turquia, Copenhague/Dinamarca, Polônia e Sérvia. Representou o Brasil no Oscar 2014.
Aquarius é estrelado por Sônia Braga, e tem uma constelação de atores no seu cast. Foi ovacionado em Cannes e recebeu o Prêmio de Melhor Filme no Festival de Sydney.
Como não poderia deixar de ser num filme de um recifense, a primeira pré-estreia brasileira se deu na capital pernambucana, no sábado 20. Foi aplaudido de pé. Todos os mil lugares do Cine São Luiz, na Boa Vista, ocupados, e só metade era de convidados.
A página do filme no Facebook compartilha reportagem do Jornal do Commercio com a fala do diretor antes da exibição do filme. Klebber Mendonça chamou toda a equipe e pediu que cada um se apresentasse. Depois, agradeceu a cada qual e dirigiu-se à plateia:
“O motivo que chamei todo mundo aqui pra frente é que há pensamento problemático e perigoso que é criminalizar o artista. A gente deve ficar de olho porque isso não é coisa do país que a gente está vivendo. Artista não é criminoso, a gente faz um trabalho honesto e sério.”
Vale à pena ler, também, a Carta Aberta sobre a Comissão Brasileira do Oscar, em que Kleber Mendonça por que defende a participação na disputa do Oscar, “essa coisa de Holywood”. Publicada na Folha de São Paulo de 19 de agosto de 2016, e reproduzida no FB/Aquarius-Filme.
Aquarius conta a história de uma jornalista aposentada, Clara/SôniaBraga, moradora do Arquarius, ultimo prédio de modelo antigo da orla de Boa Viagem, no Recife. Mulher forte e determinada, se recusa a desocupar o apartamento, mesmo quando se torna a última moradora. Enfrenta as investidas de uma construtora que quer construir no lugar mais um espigão.
Assista ao trailer oficial. É a versão internacional, com algumas diferenças da montagem brasileira, segundo a produção do filme:
A propósito da censura nada dissimulada em faixa etária, a pretexto de “sexo complexo”, a produção se manifesta também no FB:
“Surpresos com a Censura “18 anos” dada a AQUARIUS pelo Ministério da Justiça. É incrível ver que AQUARIUS está se tornando o filme mais controvertido do ano, aparentemente por celebrar a vida de maneira generosa, por ter um ponto de vista social e político e ainda trazer como personagem principal essa coisa assustadora para muita gente que é uma mulher forte, que não leva desaforo para casa. Com essa censura “18 anos”, AQUARIUS torna-se, estranhamente, ainda mais forte!”
Não resisto e compartilho o comentário do colega Leandro Fortes, ex-Carta Capital, no Facebook, sobre a patetada, mais uma:
REPÚBLICA DOS PATETAS
por Leandro Fortes

Além da repressão e do arbítrio, uma das principais características de toda ditadura é o ridículo.
A ocupação do espaço público de forma ilegítima, sem voto nem sustentação constitucional, torna o governo uma ferida aberta para todo tipo de parasita, sobretudo os mais patéticos, os mais mesquinhos.
Essa decisão de impor uma censura de 18 anos ao filme Aquarius – Filme é uma dessas retaliações que só um governo ridículo, comandado por imbecis, poder ter coragem de fazer assim, à luz do dia.
É o tipo de censura que os patetas de 1964 faziam à imprensa por meio de bilhetinhos enviados às redações, um mosaico nonsense de mensagens que ajuda a entender o tamanho do ridículo daquela ditadura.
Incrível é que, ainda assim, em nome da doença do antipetismo e com a força do protofascismo nacional, estejamos às vésperas da consolidação de um golpe de Estado.
Para manter essa gente, ridícula e mesquinha, sem voto e sem vergonha, no poder.
Beleza de paródia.
Nos comentários lá YT, alguém questiona se “Tom Jobim concordaria” com os termos. Não há questão para paródia que não seja a imitação de uma obra com propósito crítico e jocoso.
Paródia não se enquadra nas restrições do direito autoral (47, da Lei 9.610/98), dispensa autorização. Mas, faz bem crer que uma cabeça iluminada como a de Tom Jobim, o maestro não apenas concordaria, como aplaudiria a obra derivada composta por Boanerges.
Ouçam e assistam Águas de Temer:
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