por Sulamita Esteliam
É… a coisa está mais feia do que parece, e não nos iludamos, pode piorar muito!
Releio a frase que acabo de escrever, e nem acredito que saiu daqui, da ponta dos meus dedos, que chutam para a tela o que me vem da cabeça e do coração, muitas vezes sem filtro.
Costumo ser otimista, até as últimas consequências. Mas está ficando difícil, cada vez mais difícil… Como escrevi dias atrás, a esperança desce ao porão. Hoje, acrescento: e está acorrentada, e num navio em meio à tormenta – e que faz água por todos os lados.
Hoje queria escrever sobre a primavera, que, oficialmente, assume as rédeas do tempo às 11:34 horas desta quinta-feira, 22 de setembro. É quando a natureza explode em sinfonia de aromas e cores estonteantes.
Pensei em compilar fotos de flores, reais e imaginárias, que coleciono em minhas andanças pelas cidades – a que eu moro e as que visito sempre que posso viajar, pois creio que nasci com rodinha nos pés.
Mas a realidade não me permite vestir a fantasia da estação.
Amanhã é dia de paralisação nacional, um esquenta para a greve geral por garantias de direitos e contra o golpe, ainda sem data para acontecer. Se demorar muito, descarrilha na ponte para o abismo.
Leio na blogosfera as notícias e repercussões do dia. Inclusive da fala do mordomo – adoto, doravante, o epíteto cunhado pelo maridão para o usurpador Fora Temer -, na ONU. Não ouço, porque ouvir dói mais, e temo botar para fora todas minhas entranhas.
Ele tem coragem de dizer que “o Brasil possui uma estabilidade política extraordinária”!
Quer dizer que nossas instituições funcionam a todo o vapor, a despeito de a Democracia ter sido violada com a deposição da presidenta legítima por um golpe de Estado parlamentar – com o auxílio ansioso da mídia e luxuoso da Ordem dos Advogados do Brasil e do próprio Judiciário!?
Funciona, plenamente, uma democracia onde o voto de 54 milhões 501 mil 118 votos é descartado no lixo e a Constituição Federal é rasgada sem a menor cerimônia?
É normal depor uma presidenta honesta, sem crime de responsabilidade, para colocar no poder gente envolvida em todo o tipo de malfeitos?
Vivemos uma democracia apesar de um ex-presidente da República ter se tornado réu de crime sem prova, mas repleto de convicções!?
É real a estabilidade de um País onde um único juiz, e de província, é dublê de acusador e carrasco, e se acha dono absoluto da verdade e da Justiça, só quando vem ao caso?
É estável uma república onde o Ministério Público se despe do seu papel de guardião da cidadania e se arvora em juiz e prestidigitador de convicções e não analista e avalizador de provas coletadas na investigação?
Podemos tocar nossa vida à revelia de o direito de sobrevivência da maioria do povo brasileiro, inclusive o direito a não passar fome, estar sendo renegado?
É possível fazer de conta que nada está acontecendo, quando o presidente do Superior Tribunal do Trabalho não se avexa em defender a retirada dos direitos dos trabalhadores, imediatamente? Sim, por que no dicionário dessa gente não existe “flexibilizar” para melhor, concorda?
E o que dizer da articulação nacional da OAB contra o direito de greve dos bancários, sob o pretexto de garantir o acesso de seus pares aos alvarás judiciais. Aqui, em Pernambuco, tem o assentimento da Justiça que concedeu liminar que obriga as agências em greve a funcionarem por duas horas diárias, o que motivou dura nota do Sindicato dos Bancários.
Vou poupar-me de citar um a um o estupro de direitos, de consciência, de liberdade e civilidade, e de justiça, e de vergonha a que estamos submetidos. O colega Fernando Brito faz um excelente rol no Tijolaço.
Ele destaca o cinismo. Digo que há muito mais. Vivemos sob o império da hipocrisia, da rapinagem e da mediocridade.
Se é isso mesmo que lhe satisfaz, não se mexa. Você deve merecer o Brasil que nos resta.
Fotos: SEsteliam e Mídia Ninja