“O que há é uma contínua comédia política para acobertar a normalidade trágica da realidade. Normalidade trágica porque naturalizamos a tragédia social do país e seu modo violento de ser.”
Aldo Fornazieri, cientista político
por Sulamita Esteliam
Pincei a frase acima em artigo publicado no Jornal GGN sobre “A dinâmica parlamentar da crise e a omissão da esquerda”. Define, à perfeição tragicomédia brasileira que parece não ter fim, tão bem expressa no traço inconfundível do conterrâneo Genin Guerra, a quem agradeço a generosidade da partilha.
Um capítulo dessa novela de gosto claramente ruim foi apresentado hoje na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Foi lido o relatório favorável à admissibilidade do processo criminal por corrupção passiva contra o mordomo usurpador, pedido pelo procurador-Geral da República.
Outro será levado a cabo nesta terça-feira, pelo Senado Federal, que leva a plenário a votação do degola dos direitos trabalhistas. A oposição tentou brecar o processo no STF, via mandado de segurança, mas a presidente Carmen Lúcia negou.
A percepção do abismo que nos engole também não escapa aos olhos estrangeiros. Está estampada, por exemplo, no artigo em que o correspondente do The Gardian no Brasil, Jonathan Watts, se despede do país onde trabalhou por cinco anos.
Nesse breve tempo, assistiu toda a promessa de vir a ser uma grande nação se esborroar:
‘É impossível não sentir pena do país. O Brasil entrou em marcha à ré em praticamente todas as frentes.”
Refere-se à crise econômica, do desemprego o crescimento da violência, a frustração do povo com o governo, o caos político que nos arrasta para o atoleiro, o desmantelo generalizado.
Deveria acrescentar o jogo de faz de conta da mídia venal, e apontar as razões que nos trouxeram ao caos.
retrocesso social só agora começa a ser enxergado pelos expoentes do PIG, parte do golpe permanente de que o Brasil é alvo. Os jornais do dia, como Estadão, Globo e Folha, registram a ameaça de o país voltar ao Mapa da Fome, como registra Fernando Brito no Tijolaço, onde capturei a imagem ao lado.
Os 70 mil encastelados em sua condição de elite, sem sentimento de país, a quem pouco importa o destino do Zé e da Maria Povinho, condenados ao cabresto eterno. O povo é tratado como escória inimiga a ser sacrificada em nome do “deus mercado”.
Não há o mínimo de sensibilidade social, que dirá compaixão.
Quem escreve, objetivamente, a respeito é o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, em artigo que o A Tal Mineira transcreve do Conversa Afiada:
Fora Meireles! O inimigo do Povo!
Samuel Pinheiro Guimarães – no Conversa Afiada
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O Senhor Henrique Meirelles, Ministro da Fazenda, ex-presidente do Bank of Boston e durante vários anos presidente do Conselho da J e F (de Joesley), de onde saiu para ocupar o Ministério da Fazenda, procura, à frente de uma equipe de economistas de linha ultra neoliberal, implantar no Brasil, na Constituição e na legislação uma série de “reformas” para criar um ambiente favorável aos investidores, favorável ao que chamam de “Mercado”.
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O Senhor Henrique Meirelles já declarou, de público, que se o Presidente Temer “sair” ele continua e todos os jornais repetem isto, com o apoio de economistas variados e empresários, como o Senhor Roberto Setúbal, presidente o Itaú.
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Estas “reformas” são, na realidade, um verdadeiro retrocesso econômico e político e estão trazendo, e trarão, enorme sofrimento ao povo brasileiro e grande alegria ao “Mercado”.
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Enquanto crucificam o povo brasileiro e em especial os mais pobres, os trabalhadores e os excluídos, o debate político fica centrado na corrupção, desviando a atenção da classe média e dos moralistas, em torno de uma verdadeira “novela” com heróis e bandidos.
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Discute-se se Michel Temer levou ou não “contribuições pessoais” e se foram 500 mil ou 20 milhões, a prazo; se o Senador Aécio Neves pediu uma propina ou um empréstimo (informal!!) de 2 milhões de reais; se a JF corrompeu quem e quantos e ficaram livres de pena; se o Senhor Joesley merecia o perdão; se Sérgio Moro, juiz de primeira instancia, é ou não a principal autoridade judiciária do país, acima da Lei; se o Ministro Marco Aurélio é justo; se o Ministro Gilmar Mendes é imparcial etc etc etc.
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O tema verdadeiramente importante é a tentativa das classes hegemônicas brasileiras, aqueles que declararam ao Imposto de Renda ganharem mais de 160 salários mínimos por mês (cerca de 160 mil reais) e que são cerca de 70 mil pessoas e que constituem, em seu conjunto, aquela entidade mística que os jornais e analistas chamam de “Mercado”.
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O “Mercado” contra o Povo.
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De um lado, o “Mercado”:
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os empresários, promotores do Pato e financiadores do MBL; exceto aqueles que já se deram conta que Meirelles é contra a indústria;
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os rentistas;
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os grandes proprietários rurais (entre eles o Senador e Ministro Blairo Maggi e o avião interceptado pela FAB);
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os grandes proprietários urbanos;
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os banqueiros (não os bancos) e seus lucros;
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os gestores de grandes empresas privadas, modestos ex-professores universitários;
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os proprietários dos meios de comunicação;
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os grandes executivos brasileiros de megaempresas multinacionais;
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os professores universitários, formados em universidades estrangeiras, em teorias próprias dos países desenvolvidos e que, mesmo lá, fracassam;
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os economistas e os jornalistas econômicos, empregados do Mercado.
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De outro lado, o Povo:
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os 53 milhões de brasileiros que recebem o Bolsa Família, isto é, cuja renda mensal é inferior a 182 reais;
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as dezenas de milhões que são isentos do imposto de renda por terem renda inferior a 2.500 reais por mês.
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os 61 milhões que estão inadimplentes, com seus crediários;
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os 14 milhões de desempregados;
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os 3 milhões de crianças fora da escola;
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os mais de 11 milhões de habitantes de favelas (hoje chamadas comunidades!!);
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os subempregados;
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os 47 milhões que ganham menos de um salário mínimo por um mês;
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os milhões sem remédios e sem hospital.
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O programa econômico de Henrique Meirelles é o verdadeiro inimigo do povo! Não é a corrupção que distrai a atenção da verdadeira catástrofe que está sendo consolidada na legislação através de um Congresso que representa principalmente empresários, banqueiros, proprietários rurais, rentistas, etc.
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O Mercado agora deseja colocar um presidente de imagem limpa para que, como disse o Senhor Roberto Setúbal, na Folha de São Paulo, o importante são as reformas! Não importa quem as conduza!
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É preciso lutar com todas as forças contra este programa de “retrocessos” disfarçados, cinicamente, de reformas a “favor” do Povo!