
por Sulamita Esteliam
Estou de volta, enfim. Ao blogue com alguns dias de atraso, pois que, primeiro, vem o aconchego do ninho, os chamegos nas pessoas queridas, o reconhecimento do seu canto, a retomada do quintal nosso de cada dia…
Sem pressa, porque o que é nosso está guardado, melhor que seja para o bem.
Estava com saudades, Recife.
Vinte e seis dias nas montanhas de Minas, nas ladeiras da minha Macondo de origem e entorno, são mais do que suficientes para beber raiz, e ressuscitar o banzo de mar. Ainda que a brisa ande rarefeita.
Sou bicho de sol e sal.
Depois do rebatismo de areia e água salgada, agora, sim, podemos recomeçar.
Sei bem do privilégio da paisagem sem horizonte, do embalo das ondas quebrando nos arrecifes e à distância, de respirar a maresia e sentir o vento, pouco, na face carente.
No sábado, entretanto, quando caminhei pela praia, me bateu uma tristeza imensa, não obstante.
Havia peixes mortos em boa quantidade. Um pescador me disse que devem ter escapado de alguma rede.
Até um golfinho, na verdade um boto cor-de-rosa foi trazido pela correnteza. Trazia a barriga dilacerada por uma mordida. Deve ter tido a infelicidade de topar com seu predador, certamente um tubarão.
Coisas da cadeia alimentar, que se repetem, normalmente nessa época do ano, e sobre a qual não temos poder.
E Euzinha havia deixado meu celular carregando em casa…
Mas havia outro motivo para minha tristeza: há tempos não via Boa Viagem tão suja.
Nada parecido com o dia seguinte à festa de reveillon, quando as máquinas e os garis ainda não conseguiram dar um jeito em nossa moral.
Contudo, muito, mas muito plástico na área da preamar; de todos os matizes, formatos e texturas. Devolvidos pela maré de lua cheia em desencanto, e lá abandonados pela ausência total de atenção.
Atônita, olhei para o sul e para o norte, e também para a orla. Nem um gari até onde a vista alcançava, ao longo da minha caminhada de 5 km para as bandas de Piedade.
Nem amarelos, nem verdinhos, nem os vermelhinhos da manutenção e contenção. Estariam em greve?
Do posto 7 até metade do posto 9, à altura da última quadra de vôlei após o Parque Dona Lindu, ida e volta, nadica de nada nem ninguém.
Nem uma cesta de lixo para quem, de boa vontade, recolhe o que se lhe parece mais acintoso. Simplesmente não há onde depositar.
Nem mesmo em frente aos hotéis de maior ou menor, ou nenhum luxo.
É espantoso como as pessoas não respeitam seu ambiente de lazer. Se o fizessem, não deixariam pegadas nesse nível.
Embora o poder público parece se importar pouco. Talvez considere suficiente uma campanha anual, limitada à alta temporada das férias de verão.
Um tal Praia Limpa, que custa milhares aos cofres municipais, e implica em muita propaganda para a emissora que se acha dona do País – na telinha, nos três poderes e na areia.
Ainda assim, Boa Viagem é tida como a praia urbana mais limpa do Brasil. E Euzinha que sou frequentadora assídua, digo que o é, normalmente.
No entanto, não é o bastante. Volta e meia, há uma inundação de lixo, e os motivos são vários.
Falta educação continuada de banhistas e barraqueiros.
Faltam lixeiras na faixa de areia.
Falta limpeza na área da arrebentação, quando a maré começa a encher e da área da preamar, quando ela está seca.
Sobra propaganda das parcerias público-privadas que abundam a orla, nos equipamentos, nos jardins e praças beira-mar.
Houve um tempo, em gestões anteriores, que de tanto alguns reclamarem nos canais da Emlurb, a empresa de limpeza urbana, esse trabalho foi feito.
Então, o meu, nosso quintal ficou ainda mais lindo.
Deveria ser cobrado dos barraqueiros o recolhimento do lixo que seus clientes deixam para trás. Ainda que seja responsabilidade de cada um cobrir os próprios rastros.
Afinal, o pessoal que presta serviço na praia usa espaço público para fazer seu trabalho – uma faina inigualável, é preciso reconhecer – tem aí o seu ganha pão; e devem ser parceiros na preservação.
Todavia, devo repetir o poeta, à falta de inspiração que se valha: apesar dos estragos, quem é do mar não enjoa.