por Sulamita Esteliam
Ora, ora, ora… com que então que a digníssima presidenta da Suprema Corte, Carmem Lúcia, resolveu pautar o julgamento do Habbeas Corpus de Lula para esta quinta, 22! Tamanha magnanimidade faz jus aos princípios democráticos do Direito.
Pena que tudo pareça o que de fato é, um jogo de cartas marcadas para garantir à dona do Brasil, as imagens de Lula algemado no Jornal Nacional.
E ninguém poder acusar a ministra de ter agido contra o primado da Constituição, e deixar na gaveta um pedido que equivale ao SOS de um náufrago.
Sem contar que os escaninhos da Presidência do STF equivalem ao labirinto de Dédalo.
Assim como a roleta de distribuição dos processos, e a agilidade na condenação ou no reconhecimento do direito, pende sempre para a conveniência do réu. Mas só quando vem ao caso.
Pura coincidência o TRF-4 marcar o julgamento dos embargos infringentes da condenação do ex-presidente, a 12 anos e 1 mês, para a segunda-feira, 26.
Dupla coincidência, já que nesta data o justiceiro inquisidor de Curitiba, Sérgio Moro, que está de mudanças para os Estados Unidos, é o entrevistado do Roda Viva, programa da TV Cultura que há muito deveria ter seu nome mudado para Bola pro Alto. É a despedida também do Augusto Nunes, um sujeito que se diz jornalista, mas de bom grado aluga sua pena aos poderosos de plantão.
A verdade é que sua excelência Carmem Lúcia, assim mesmo, com minúsculas, viu a oportunidade de livrar-se do vexame de revelar-se fiel à pressão dos filhos do Roberto Marinho, sem ao menos arrepiar a franja.
Correu o risco de ser constrangida por seus pares, ao vivo e em cores pela TV Justiça, para todo o Brasil. O ministro Marco Aurélio faria questão de ordem sobre a Ação Direta de Constitucionalidade que reexamina a prisão depois da condenação em segunda instância, na seção desta quarta.
Já que ela fugira de reunião combinada com o colegiado, a partir de sugestão do decano Celso Melo, para a terça; uma tentativa de se chegar a um acordo que não desmoralizasse o papel do Supremo de guardião da Carta Magna.
O STF, na verdade, infringiu a Constituição ao negar o direito, não de Lula, mas de todo e qualquer réu, aguardar em liberdade o exame de todas as possibilidades de recurso contra a condenação. É o que no jargão do gueto jurídico se convenciona chamar de trânsito em julgado.
E não é esta reles blogueira, metida a entender de leis e direitos quem o diz. São juristas de porte e suporte, dentre eles o professor Alamiro Veludo Salvador Neto, aquele a quem o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator do caso Lula no TRF-4, recorreu para embasar a condenação do ex-presidente. E foi contraditado por ele em rede social.
A lembrar que Lula foi condenado no processo da Lava Jato por não ser dono do triplex do Guarujá, que também não tem nada a ver com o que investiga a operação caça-corrupto que se arvora em passar o Brasil a limpo. Mas só quando vem ao caso.
Pois justo Alamiro, que afirma ter sido citado fora do contexto, quem diz em entrevista a Leonardo Sakamoto, em seu blogue:
”Esse debate que agora está sendo equivocadamente vinculado de maneira exclusiva ao ex-presidente Lula, no fundo, é sobre qual o limite do poder do Estado brasileiro para começar a punir uma pessoa.
(…) ”Existe uma série de pessoas no Brasil que estão cumprindo penas antecipadas, ao meu ver, de forma contrária à Constituição.”
No entender do professor, o STF usurpou o Poder Legislativo ao definir a segunda instância como o momento em que se inicia a punição.
”O grande problema é quando o Judiciário, talvez atendendo ao clamor social, resolve passar por cima do texto legislativo e – mais do que isso – do texto da Constituição.”
Bom, à essa altura, se alguém tinha dúvidas, o jogo parece bastante claro: ao invés de trazer à luz a possibilidade de retorno ao princípio constitucional, que atende ao coletivo, dona Carmem optou por particularizar, ou melhor, fulanizar o debate legal.
O HC diz respeito tão somente a Lula. E aí as chances de prevalecer o combinado, com a Globo, com o Supremo, com tudo, são maiores.
Se der errado, ninguém pode dizer que ela não tentou.