O Brasil regido pelas togas entra em recesso

por Sulamita Esteliam

Leio no A Postagem que o ministro Edson Fachin, cambalhoteiro na genial charge do Aroeira, liberou para exame em plenário o recurso extraordinário que requisita que Lula aguarde em liberdade o julgamento dos recursos contra sua condenação no STF e no STJ.

Significa que a chave do encarceramento do ex-presidente depende de gesto de boa-vontade de Carmen Lúcia: colocar ou não colocar em pauta a possibilidade.

Antes do recesso, além da inviabilidade do tempo, seria exigir um pouco demais de sua excelência, que tem demonstrado ser parte do jogo para inviabilizar Lula candidato.

“Manipulação” é a palavra, usada não apenas por escribas, como Euzinha, para definir o comportamento da presidente do STF e do ministro-relator, mas por ninguém menos que Marco Aurélio Mello, ministro da Suprema Corte.

Então, o recurso fica para agosto, e talvez a chance de entrar logo em pauta está na velocidade com que a Segunda Turma, chamada pela defesa de Lula a revisar a decisão de Fachin de remeter o caso ao plenário, se manifestar a respeito.

Os advogados do ex-presidente alegam que a decisão do ministro-relator da Lava Jato fere o princípio constitucional do juiz natural, que coloca na segunda turma a responsabilidade de decidir sobre o recurso.

É nesse vai e vem – me vem à cabeça certa musiquinha cantada por Moraes Moreira -, que uns e outros se dão bem e a gente se atrapalha.

Enquanto isso, os ministros do Supremo entram “em férias escolares”, sem ter feito o dever de casa, como observa Jânio de Freitas, em artigo publicado na Folha, e que reproduzo mais abaixo, via Tijolaço.

Pelo menos não inteiramente: Ricardo Lewandowski tirou o pirulito da boca  dos jacarés de boca aberta para engolir o banquete das riquezas nacionais, parte delas. Nesta quinta concedeu duas liminares: uma suspende os leilões de privatização da estatal de energia de Alagoas; outra impede que o governo venda empresas públicas, de quaisquer setores, bancos inclusive, sem autorização do Legislativo.

Uma trava, ainda que parcial e temporária, no saque irresponsável do nosso patrimônio.

Com a economia patinando, o desemprego crescente e o retorno da pobreza assombrando, também sob o aspecto político-eleitoral, os golpistas estão muito embaralhados. E não têm para onde correr a não ser fiar-se nas togas e armas que lhe são fieis. E é aí que mora o perigo.

Outra pesquisa, divulgada nesta quinta, desta vez do Ibope, comprova que não tem pra ninguém com Lula no páreo eleitoral. Talvez porque a memória do povo não seja tão ruim assim como se pinta.

Aliás, o cientista político André Singer, da Unisinos, está convicto disso e o manifesta em entrevista à BBC Brasil, reproduzida pelo portal da universidade gaúcha. Ex-porta-voz do primeiro governo Lula, para ele, a resiliência do ex-presidente, que há quase três meses na prisão mantém-se na liderança das intenções de votos, se deve à lealdade de eleitores que superaram a miséria graças às políticas públicas de seus governos.

Com Lula fora, há um esforço hercúleo, em particular nas leituras midiáticas dos resultados, para ressuscitar a burca da Marina Silva, o que mostra o nível do desespero da turma do contra.

Esperar e receber

Janio de Freitas, na Folha

Lá se vão os ministros do Supremo para as férias escolares. Deixam muitos deveres inacabados. Com isso, deixam também incertezas e inseguranças cujo efeito é submeter o país ao que no tribunal mesmo chamam de “instabilidade jurídica”.

O ministro Marco Aurélio Mello fez uso, a propósito, de um termo talvez nunca aplicado ao Supremo: “manipulação”. Assim se referiu à recusa da presidente Cármen Lúcia, que se concedeu exclusividade na definição da pauta de julgamentos, a agendar a apreciação de determinadas ações prontas para tal desde dezembro. O previsto é que a posição da ministra seria vencida.

As ações, no caso, questionam a compatibilidade, com a Constituição, da prisão de réus no primeiro nível de recursos contra a condenação —a segunda instância, dos desembargadores.

A Constituição, porém, determina que a prisão só se dê depois de esgotados, pela defesa, os recursos a todos os níveis. Há pelo menos dois componentes polêmicos na decisão por um voto pela prisão antecipada. Um, a sua compatibilidade, ou não, com a ordem constitucional. Outro, a competência para modificar princípio da Constituição, o que compete ao Congresso.

Com a “manipulação” da agenda, como Marco Aurélio “nunca viu em seus quase 30 anos de Supremo”, Cármen Lúcia deixa essa e outras complicações em suspenso. Presos ou soltos, não só da Lava Jato, são muitos milhares os pendentes da confirmação ou correção do desvio pelo Supremo.

Mas esse é um caso simbólico, não o único do estado tumultuoso que incentiva outros na pretendida casa das decisões convincentemente orientadoras.

O ministro Edson Fachin, por exemplo, deixou sinais de “manipulações” nos últimos dias. Depois que pediu o julgamento de uma ação no dia 26, terça passada, Fachin fez o repentino arquivamento dela. Era o pedido de libertação de um preso porque os falcões do Tribunal Federal da 4ª Região, a da Lava Jato, protelavam a apreciação de recursos do réu.

O que se passou foi a corrida da vice-presidente do TRF-4, Maria de Fátima Freitas (?!) Labarrère, para dar uma decisãozinha na ação retida, e menos de uma hora depois o arquivamento, no Supremo, estava feito por Fachin. Não são necessários mais sinais de armação.

Em outro caso, este na última terça (26), a Segunda Turma do Supremo examinou um recurso contra prisão do réu após segunda instância, ordenada pelo TRF-4. A ordem não apresentou a fundamentação exigida, nem teria fatos comprováveis para fazê-lo. Era evidente o reconhecimento de que o réu tinha o direito de responder em liberdade ao restante do processo.

Mas Fachin tentou impedir. Pediu vista para reter o que estava à sua vista e compreensão ali mesmo. Por sorte do réu, Dias Toffoli frustrou Fachin com um habeas corpus.

É claro que esses casos e seus ardis referem-se a Lula e Dirceu. As turmas do Rodoanel e do Metrô paulistas, entre vários aécios, nem chegam a tais níveis judiciais.

Mas está visto que certas contaminações fazem mesmo necessárias as férias de alguns ministros do Supremo, para refletir sobre o que devem ao país. Se algum o fará, é suposição que depende do otimismo dos que esperamos pouco e recebemos cada vez menos.

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