por Sulamita Esteliam
Não deveria me chocar. Afinal, conheço e reconheço muito bem a matéria de que somos feitos.
A natureza humana, quando se revela em sua animalidade, foge ao princípio da racionalidade. É quando mais se distancia do humano.
Ninguém da prole, e sou grata por isso. Mas dói, quando é gente muito próxima, muito mais quando é sangue de origem correndo nas veias.
E como dói!
Vinha tendo embates duros com gente de minha particular afeição por conta da omissão. Agora, mudou o patamar. Já desconfiava, mas há dentre os meus, seguidores convictos do você sabe quem.
Pior, são mulheres. São inteligentes. São criativas. São filhas e são mães, ou tias. São cristãs; evangélicas ou católicas.
Dói mais ainda por que algumas delas são pessoas que abrigam na categoria de educadoras.
Tudo bem, há a educação conservadora, em nome de princípios, mas a serviço dos dedos. Às vezes até cedem os anéis. Migalhas em nome de manter tudo como está, pouco importa se piorar.
Estão postas à prova, e de fato, descartam um professor, com formação e lastro de doutorado, e com larga e qualificada folha de serviços prestados à educação.
Escolhem o inominável. Um capitão defenestrado por tentar sabotar o quartel. Um deputado que em 28 anos de política tem em seu currículo dois projetos e toneladas de sandices.
Um estimulador de violência contra mulher, negro, índio, pobre e qualquer um que discorde da sua falta de substância.
Um homem capaz de botar arma nas mãos de uma criança.
Os efeitos de sua pregão estão aí, a olhos e sangue vistos.
Um mentiroso, que se vale de um super-robô, a preço de milhões, a operar um sistema que se reproduz como vermes para empestar os incautos.
Um covarde, que foge do debate, por que não tem projeto e nem o que dizer – fora de arrivismos e impropérios.
Em nome de Deus. Ou em nome de Jesus.
Não. Não. Não. E Não.
Já não tenho religião, mas meu espírito forjado no cristianismo e cevado no humanismo não alcança essa viagem rumo ao inferno.
Estamos numa guerra, sim. E é contra a mediocridade, que aplaude e venera o autoritarismo, a barbárie. O fascismo é apenas consequência.
Tem um texto circulando pelas redes sociais que tenta ser condescendente. Diz, “sua tia não é fascista, ele está manipulada”. Pode ser.
Pois digo que o fascismo cria aves de rapina, que se alimentam de miolos disponíveis.
Euzinha, já disse, fico com a luz.
E a luz que alumia o horizonte, agora, vem do professor Fernando Haddad e da resplandecente Manuela.
Não estou sozinha. Muito antes, e felizmente, pelo contrário. Tenho o bom senso, milhões de vozes e traços, a História e a Constituição do meu lado.
Para fechar, compartilho o texto do amigo pernambucano, Marlos Guedes, um educador que se respeita, além de talentoso artista.
Agrego o cartoon de outro amigo querido, Cau Gomez, de cujo talento e generosidade, frequentemente, A Tal Mineira se serve; e é eternamente grata.
Educação pelos fogo e pelas cinzas
Marlos Guedes (*)
O candidato a presidência, Bolsonaro, pelo PSL, em entrevista a rádio Jovem Pan (*1), declarou que vai retirar a influência pedagogia de Paulo Freire das escolas. E que faria isso com um lança-chamas.
Questionado pelos jornalistas, o cabra disse que se tratava de uma figura de linguagem. Que era tirar a influência de Paulo Freire na educação. Então, por uma coisa ou por outra coisa, vamos tentar entender a figura de linguagem. E vamos juntar isso a outra proposta do mesmo senhor que é ressuscitar a disciplina Educação Moral e Cívica. As duas propostas estão interligadas, tanto do ponto de vista histórico, quanto do ponto de vista do objetivo que as propostas encerram em si mesmas.
As figuras de linguagem do candidato estão sempre relacionadas ao excitamento à violência, como metralhar e lançar chamas. Com gestos ou instrumentos, como utilizar um pedestal de microfone para imitar uma metralhadora em ação. Além do mais, um defensor da tortura. Algo de triste memória como prática dos seus pares no período da ditadura. A utilização dessas figuras de linguagem, sempre relacionadas a violência, denota impulso emocional sádico, próprio dos fascistas. Se não pode materializar seus desejos na prática por conta de estarmos ainda numa democracia, vai tentar por em ação propostas que trilharão, sob a ótica da legalidade, os mesmos objetivos.
Então, vejamos apenas estas duas propostas do candidato que citei acima. A disciplina escolar Educação Moral e Cívica começou em 1969 no governo do ditador Arthur da Costa e Silva, período em que se instituiu a “cultura do silêncio” sob a mira do fuzil a céu aberto. O conteúdo didático da disciplina tinha caráter autoritário, intimidador e conservador, com o propósito de adestrar pessoas, negando-lhes o direito a uma pedagogia emancipadora e focada no contraditório. Ao propor o retorno dessa disciplina às escolas, o candidato tenta ressuscitar os mesmos objetivos pedagógicos da ditadura. Paulo Freire batizou esse modelo pedagógico como ” educação bancária”, algo para a conformidade e alienação mental, negando-se, portanto, a prática para a liberdade.
Sobre o lança-chamas, arma que utilizaria para queimar os livros de Paulo Freire, o candidato diz ser apenas uma figura de linguagem. Então vejamos o que significa essa figura de linguagem. A arma tem como função jogar fogo sobre algo, quer seja pessoas ou objetos, queimar, aniquilar, destruir, resultar em cinzas. O que demonstra, mais uma vez, o seu emocional perturbado e fascista. Além de não entender nada de economia, parece também não entender de muitos outros assuntos, como a educação ou não ter menor noção de quem seja Paulo Freire.
Costumo dizer que o candidato tem visão muito limitada sobre os mais diversos assuntos, talvez entenda bem de armas, torturas e outras coisas relacionadas a pólvora em ação. E é justo a violência, uma facada que sofrera, que se tornou seu álibi para não comparecer aos debates. Como o vice é um desajustado mais severo, então, jamais terá sua autorização para os debates na grande imprensa.
Algumas considerações sobre Paulo Freire. Este pernambucano, nordestino, brasileiro, está entre os mais respeitados pedagogos do mundo. Sua notoriedade na pedagogia mundial rendeu-lhe 29 títulos de Doutor Honoris Causa nas universidades da Europa e América. Patrono da Educação Brasileira. Em 1986, recebeu prêmio da UNESCO de Educação para a paz. Suas obras tem como base a pedagogia como prática para a Liberdade.
Foi por conta de sua pedagogia do contraditório, como filósofo e educador para a liberdade, que, no período da ditadura foi preso e depois expulso do Brasil. No exílio percorreu o mundo praticando o que bem sabia, educar para a cidadania plena. Em 1980, com a anistia política, retornou ao Brasil e continuou sua mesma pegada pedagógica libertadora.
Tudo o que é libertador é visto pelo candidato como uma ameaça comunista ou socialista. Respira, ainda hoje, os mesmos argumentos fascistas da época da ditadura de 1964.
Jamais me representará! Voto no ex-ministro da educação do governo Lula que tem uma visão democrática e de convivências com as divergências de ideias, Fernando Haddad, 13! Com Haddad a educação continuará como instrumento para a cidadania e para a liberdade. E nosso Paulo Freire continuará presente nas escolas promovendo a liberdade de pensamento e ideias e, assim como, estimulando as mais diversas expressões de pensamentos!!
(*) Marlos Guedes, natural de Bom Conselho, é formado em Psicologia Social. Foi professor de matemática e de psicologia social, trabalhou e se aposentou pelo Banco do Brasil, foi dirigente e presidente do Sindicato dos Bancários de Pernambuco, defensor do socialismo e é filiado ao Partido dos Trabalhadores. Atua, também, como compositor musical, poeta e declamador de suas obras e de inúmeros poetas brasileiros e de outras nacionalidades. Tem quatro músicas gravadas pela banda Rhudia e fez vocal em duas delas. Atualmente desenvolve um trabalho de Interlocuções Poéticas Musicais em parceria com o músico, poeta cordelista, cantor e compositor Allan Sales.
(*1) Entrevista na rádio Jovem Pan está disponível no YouTube. Realizada em 22 de maio de 2018. A fala dele sobre Paulo Freire está no trecho entre 17 e 19 minutos da entrevista.