O recado das urnas é, sim, uma brisa de esperança…

por Sulamita Esteliam

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Talvez seja esse o recado que fica das urnas nestas eleições municipais. Mas o que fica no ar é uma brisa de esperança e a certeza da luta como arma do bom combate.

Ainda não é hora de lançar âncoras. Tem segundo turno em 57 municípios, e os progressistas, que seja a esquerda, estão em 31 deles. Desembarcar só após as 17 horas do dia 29 de novembro.

Vou e volto: o povo negro chegou ao poder de legislar para os seus, e são 44% dos eleitos para as câmaras municipais. Boa parte são mulheres, 18% – e homens também – incluindo a gente trans que conquista pela primeira vez 25 cadeiras na vereança, e deixa à espera 176 suplentes.

E os indígenas, ainda que em menor número, voltaram a emergir eleitoralmente. Todas e todos comprometidas/os com os direitos humanos, com a cidadania imprescindível para a vida fazer sentido neste plano.

Crentes e ateus hão de concordar, que é preciso cada um fazer a sua parte, coletivamente. Plantar para colher e distribuir, cristã e/ou comunistamente. O que é comum a todas e todos pertence.

A pauta identitária, antiracista, anti-homofóbica, antimachista calou fundo nos corações de brasileiras e brasileiros. Ainda é pouco, mas é um bom começo, e é a grande boa notícia destas eleições.

Nas palavras do maridão, Júlio Teixeira: é o povo votando à sua imagem e semelhança. Uma hora a gente aprende. 

Como na contagem dos mortos da pandemia, e dos crimes ambientais promovidos pela privatização e pela ganância desenfreada, os projetos devem enxergar e chegar às pessoas em primeiro lugar.

Há vida e  há morte por trás dos números.

Por óbvio, as interpretações variam conforme o olhar e a conveniência: da mídia venal, que a despeito de analisar os fatos, os distorcem no viés de quem lhes sustenta; das esquerdas, e isso inclui o maior partido da América Latina desse lado do espectro, o PT, alvo de todos os torpedos – à direita e à esquerda -, e que naturalmente se defende puxando sardinha para seu jequi.

Fato é que as chamadas esquerdas deram uma sacudida no balaio onde tentam enterrá-la, sobretudo desde 2016, com o golpe em forma do impeachment da presidenta Dilma. E a direita dita civilizada saiu do esquife onde esteve soçobrando nos últimos anos, para botar a cabeça de fora. 

O fascismo, a ultradireita que se mantém no poder central, dançou na geral. Exceção ao Rio de Janeiro – o que há com a gente carioca, Cristo Redentor…!? -, do Sul do Brasil e de um ou outro edil pré-formatado, ardeu no fogo do inferno que despeja sobre nós.

Mesmo assim, aí sou obrigada a concordar com analistas à direita e à esquerda: o Brasil endireitou,  no mau sentido, e o PIG pode regozijar-se de ter feito o trabalho sujo. Inclusive com a eleição do capiroto-genocida, que serviu para sustentar a narrativa do “radicalismo” que mantém a casa-grande dona da situação.

Cínicos e hipócritas é o que são, todos esses que babam veneno no prato que alimenta sua indignidade e a miséria.

Ah, o PT encolheu!? Sim, verdade, o número de prefeituras conquistadass reduziu para 179, na conta do G1, 189 na conta do Poder 360 Graus – em 2016 restaram 274 das mais de 600 do pleito anterior. Fogo cerrado. Mas até Fênix ressurgiu das cinzas, e estamos longe disso.

Prova disso é que 15 dos 57 municípios em que há segundo turno – dentre eles 18 capitais -, têm o partido na cabeça de chapa: Anápolis (GO), Cariacica (ES), Caxias do Sul (RS), Contagem (MG), Diadema (SP), Feira de Santana (BA), Guarulhos (SP), Juiz de Fora (MG), Mauá (SP), Pelotas, Recife (PE), Santarém (PA), São Gonçalo (RJ), Vitória (ES) e Vitória da Conquista.

As mulheres chegaram ao embate final em cinco deles: Celia Tavares em Cariacica (ES), Marília Campos em Contagem (MG), Margarida Salomão em Juiz de Fora, Marília Campos em Recife e Maria do Carmo em Santarém. Em três deles, o adversário é do DEM – nos dois primeiros e no último citados -, e em dois do PSB, todos homens.

Em 31 cidades grandes, há um candidado progressista concorrendo, ou da esquerda estendida, digamos assim: PT, PSol, PCdoB, PDT, PSB e Rede.

Além das cinco do PT há outras três mulheres na disputada: Manuela D’ávila em Porto Alegre (PCdoB/RS), Socorro Neri em Rio Branco (PSB-AC) e Suely Vilela em São Vicente (PSB-SP).

A bem dos fatos, há mulheres à direita no segundo turno, também: em Aracaju-SE, Pelotas-RS, Ponta Grossa-PR, São Vicente e Taubaté-SP e em Uberaba-MG.

Na megalópole São Paulo, Guilherme Boulos engoliu o candidato-robô-advogado-pastor, Celso Russumano. E lá, como em Fortaleza, onde o ex-partido de Leonel Brizola, e agora do Ciro, disputa com um capiroto envergonhado, pois esconde quem o apoia. Ninguém vai para Paris.

A parceria – Foto: captura de tela

Boulos e Erundina, fantástica em sua energia de jovem aos 90 anos. Têm o apoio incondicional do PT – de Lula a Gilmar Tatto, passando por Dilma Rooussef, Fernando Haddad e toda a velha e nova guarda petista. 

O partido “liquidado” segundo quer a mídia venal, fez o vereador mais votado do Brasil, Eduardo Suplicy, e leva o posto de maior bancada do Legislativo municipal, mesmo perdendo uma vaga. Ainda que divida o pódium com os tucanos, controladores do poder local; cada um elegeu oito.

O PSol também disputa o segundo turno em Belém do Pará, com Edmilson Rodrigues. E praticamente dobrou sua representação de vereadores Brasil afora. 

Aconteceu no Recife, minha Macondo do coração, onde resido há quase duas décadas e meia  Com o luxo de ter feito a vereadora mais votada, Dani Portela, mulher negra e advogada popular. Ivan Moraes, jornalista e ativista do direito à comunicação, foi reeleito.

O PT passa a três vereadores. A mais votada é Liana Cirne, professora de direito, advogada popular e ativisda do direito à cidade, minha candidata. Reeleito o professor Jairo Brito, e está de volta Osmar Barreto.

Importante registrar: quebrei um jejum de três eleições municipais a ver navios. Vereadora já tenho. A Prefeitura, torço, milito, voto e confio, vem no segundo aportamento.

Já o PSB do adversário-garoto João Campos, candidato da situação, tem sete, apenas dois novatos. O PCdoB, ex-aliado petista na capital, migrante, chega com Cida Pedrosa e renova o mandato de Almir Fernando.

Cinco é o tamanho da bancada de Marília Arraes na administração da Prefeitura da capital pernambucano, se assim o povo decidir. Mas jogo de cintura e firmeza não faltam a esta mulher, que tem na vice João Arnaldo, do PSol. 

Os conterrâneos da Macondo de origem, resolveram sacramentar mais um mandato ao atual prefeito, Alexandre Kalil (PSD). Previsível, dada a avaliação de seu mandato, particularmente frente à pandemia e às enchentes.  Não adianta a gente ter críticas, se o povo não enxerga assim.

Aliás, o partido a que se filiou recentemente o empresário e ex-presidente do Atlético Mineiro para disputar a reeleição, foi o que mais cresceu nestas municipais em todo o país, junto com o DEM.

Na capital mineira deu ruim, apesar dos 63% de votos alcançados na majoritária: reduziu a bancada de 13 para sete vereadores, nenhuma mulher.

Nilmário Miranda (PT), ex-secretário de Direitos Humanos de Lula, e do governo Pimentel em Minas, deputado federal e estadual teve votação muitíssimo aquém do que já contribuiu para o bem-estar de sua gente. 

O PT tinha 47 candidatos à vereança, manteve o tamanho da bancada, mas renovou com duas vereadoras de fibra: Macaé Evarisco, negra, educadora e assistente social; e Sônia Lansky, médica e defensora do SUS, que traz ao PT a experiência do mandato coletivo, excelente invenção do PSol – em Beagá e aqui.

Aúrea Carolina, deputada federal pelo PSol,  foi melhor votada, mas não o suficiente para levar a disputa para o segundo turno. E ainda pegou Covid na campanha. Nossa torcida pela sua recuperaçao plena e breve

O segundo lugar ficou com um aliado do capiroto-genocida; pior, um jovem de 24 anos, que se autodenomina “conservador”. E que segue à risca a cartilha de seu inspirador: causar para chamar para garantir espaço midiático.

O Psol em Beagá também fez duas vereadoras: Iza Lourenla e Bella Gonçalves, esta última, reeleita; perdeu uma cadeira.

No campo progressista, o PDT, que não tinha representantes, chega com três, catapultados pela grande renovação: a professora Duda Salabert, a primeira trans a assumir um mandato, campeã de votos promete trabalhar para que Belo Horizonte volte a ser a cidade jardim.

A Rede também chega renovando, com Gilson Guimarães. O aglomerado da Serra está em festa.

Resumo da ópera:  em 41 cadeiras, o campo progressista fica com oito no legislativo da capital mineira; 16 em 39 na capital pernambucana; 9.900 em 58.208 vagas nos 5.568 municípios brasileiros.

O PT, que perdera metade de sua bancada de vereadores em 2016, até agora fez perto de 2600 representantes. O PSol aumentou em 37% sua representação nacionalmente, com 77 vagas.

A apuração para vereança ainda não terminou. Mas os dados disponíveis até o final da segunda, 16, mostram que a esquerda expandida se saiu bem melhor na fita. Não foi o massacre de 2016. Mas ainda tem muito o que caminhar.

E é falácia pregar que a esquerda deveria ter se juntado nessa disputa. No caso de Belo Horizonte, basta somar os números da votação de ambos para ver que não adiantaria.

Mesmo com os minguados votos do PCdoB, que até ficou sem representação na Câmara, e do recém-criado UP. O PSB, adversário do PT na cidade, também está fora do Legislativo municipal.

A lição que permanece a cada eleição, com campanha, pesquisa ou bola de cristal, é a de sempre: as urnas ecoam razão explicitada, bem ou mal entendida. No bom e velho lugar comum, em cabeça de eleitor e bumbum de neném, ninguém sabe o que vem.

Não obstante, o exercício da democracia é um aprendizado constante. Desistir é entregar o ouro, o seu direito de escolha, para o bandido.

Fecho com a capa dos jornais pernambucanos no pós-1º turno. A campanha para o segundo tempo já está à toda.  Nem preciso dizer que #TôComMarília!

Fontes citadas ou consultadas:

TSE

Agência PT

Poder 360

Estado de Minas

Brasil de Fato

Revista Fórum

 

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