Leitura Literária: poetas em transe num Brasil despedaçado

por Sulamita Esteliam

Tenho variado o dia de gravar o Leitura Literária para o canal A Tal Mineira TV no Youtube. Meu tempo é ditado pela lida diária e também por meu estado de espírito. Há dias em que é melhor pular. Esta semana, gravo no domingo.

No sábado, quebrei o jejum da poetagem e escrevi uns versos diretamente no Instagram, inspirados nas fotos que fiz  no dia em que pude caminhar na praia.

Tem chovido no Recife, e as águas coincidem com a reabertura da areia para exercícios individuais, após quarentena de 14 dias.

Só mesmo a chuva para manter a praia praticamente deserta. Leio o poema no fechamento do vídeo da semana, e compartilho mais abaixo.

Antes, quero dividir com você a letra de uma canção que tem tudo a ver com o momento, embora tenha sido composta há cerca de um ano, se não mais. É um belo convite à reflexão. Compartilho o vídeo ao pé da postagem, para quem gosta de cantar aprender a melodia tbm.

A autora é Hyanna da Cunha, uma pessoa querida, que entra na categoria sobrinha afetiva. É filha de uma casal amigo e sobrinha do maridão, Julio. A família traz a arte no sangue.

É parte ativa da cena underground de Beagá, a capital mineira. Mantém um canal no Youtube: Hyanna Solta o Verbo – Poesia e Toda a Arte. Produz na velocidade de um cometa. Nas palavras da artista, “a vibe do canal sempre foi fazer pensar, fazer a revolução, pequena ou grande…”.

Poesia visceral, para chacoalhar a acomodação reinante.

Em Transe

Meu quintal anda assim,
tão livre que nem parece
praia urbana…

E pensar que essa beleza escancara
a agonia de almas quebradas
na pandemia.

A fome cobre
as esquinas, o calçadão, praças e becos
por entre as torres de mármore e vidraças
espelhadas.

Não há vagas
nem frestas cintilantes
a serviço da vida.

Os sinais
do tráfego tremulam de dor.
E o orgasmo dos mercadores
da morte se multiplica.

(Euzinha, mesma. 10.04.2021)

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Em Meio Multidão

por Hyanna Cunha – letra e música

Papo reto na veia
A palavra que sangra
E o silêncio que corta
Em meio à multidão.
Alienação, alienação.

A vontade de tudo
Do extremo e do mundo
E o desejo mútuo
Em meio à multidão.
Alienação, alienação.

A fogueira está pronta
Lá vai outro pensante
Ser consumido em chamas
Por sua missão.
Alienação, alienação.

E eu ali congelada
Vendo a carne queimando
E a garganta entalada
Em meio à multidão.
Alienação, alienação.

O remorso profundo
A ferida aberta
E a dor latejante
Em meio à multidão.
Alienação, alienação.

Sou dessas, nao de outras
N]ao engulo a mentira
E o ódio de vocês, não.
Alienação, alienação.

Sou das bruxas que restaram
Não vou negar minha essência, não.
Alienação, alienaçao.

E a plateia mudou de tom
Me conteve e me ergueu
Em meio à multidão.
Alienação, alienação.

Haveria uma outra fogueira, então.
Alienação, alienação.
Haveria uma outra fogueira, então…

Devo registrar que não se preocupe com esta velha escriba. Apesar de toda a tristeza e indignidade, sou do tipo que não perde a mania de ter fé na vida, como a Maria da canção de Milton Nascimento e Fernando Brant.

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