por Sulamita Esteliam
Retomo o Leitura Literária com trechos do livro “Quarto de Despejo – Diário de uma favelada”, o primeiro volume dos diários de Carolina Maria de Jesus. Conforme prometido, lá em março.
Escolhi os relatos da primeira semana de junho, páginas 48 a 55 da 10ª edição, Ática, 2020. Muito bem-cuidada e ilustrada – Vinícius Rossignol Felipe assina – diga-se.
A catadora de papel relata as agruras de mulher preta, mãe solteira de três, pobre e favelada naqueles fins de 1958.
Moradora da favela Canindé, às margens do Tietê, a primeira de São Paulo, descreve o cotidiano da favela, as misérias material e humana que frequenta as vidas sem esperança de futuro.
Carolina de Jesus é uma mulher que ama ler e escrever. Observadora, consciente da injustiça da sua condição, crítica do descaso dos políticos para com a situação do povo operário, pobre, favelado. Uma mulher que não se cala diante da realidade que lhe bate com a porta na cara.
Descoberta pelo jornalista Audálio Dantas, a publicação original e as subsequentes preservam linguagem original da autora. Opção editorial corajosa.
Não é difícil imaginar que, em 1958-60, o preconceito linguístico, filho do preconceito de classe e do racismo, fosse mais escancarado do que atualmente.
O livro é uma ponte entre o Brasil que fomos e o que continuamos a ser, e que acreditávamos ter escapado.
É leitura indispensável.