por Sulamita Esteliam
A gente bem que quer escrever sobre boas novas, energias renovadas, alto astral e tal… Mas o ano mal começou, e o caos teima em se reproduzir, feito as mentiras contaminantes do Coisa Ruim e seus asseclas.
O Brasil segue (verbo amado pela amiga Eneida da Costa) desmantelado no abismo infindo, no fundo do poço a que foi empurrado.
E há quem se orgulhe da façanha: 10,5% de inflação – que não mede o custo de vida real -, 14 milhões de desempregados, mais de 20 milhões não tem o que comer, e outros 43,5 milhões não comem o suficiente todos os dias.
Milhares estão ao léu, nas calçadas, sob pontes e viadutos, cobertos por plásticos, papelões. Lona é luxo. Sem contar os que caem pela violência nossa de cada dia, civil, do submundo e a oficial.
Incomoda, e muito. E aqui não vai a questão estética: a fome é feia, a miséria é degradante. Mas a falta de empatia e de solidariedade aviltam.
Ainda assim como há quem escolha se manter na ignorância. E há os que tateiam sem perceber um milímetro à frente das ventas.
Domingo passado ouvi da boca de um garoto de seus 18 anos que não acredita na pandemia, no uso de máscara, na vacina. Para ele, tudo é invenção para vender máscara, vacina e… caixão, tive que completar: 620 mil na conta possível, já que os dados oficiais, sim, economizam, e são pouco críveis.
Só em Pernambuco já passam de 20.500 histórias interrompidas desde o início da pandemia de Covid-19. O governo não fala em Ômicron, mas a onda de contágio chegou com força ao estado. Apesar de os números oficiais apontarem 82,71% da população elegível – acima de 12 anos – o com esquema vacinal completo.
A primeira semana epidemiológica registrou crescimento de 50% em sete dias de casos de Srag – síndrome respiratória aguda grave, 138% em 15 dias. Os números incluem os casos de Influenza A – H3N2, e impactam diretamente o sistema de saúde, embora a maioria seja de casos leves.
Tanto, que o governo tomou providências e alterou os protocolos de restrições em eventos, com redução drástica de público, exigência de passaporte vacinal e até testes de antígeno para acesso. Ainda que não tenha detalhado como vai fiscalizar o cumprimento das normas.
No Recife, na praia, a céu aberto, a coisa segue ao deus dará… Boa parte do pessoal das barracas já aposentou as máscaras. Só usa até a fiscalização passar. E são 7,8 km de orla de Boa Viagem ao Pina, sem contar Brasília Teimosa.
O rapaz, personagem do dia, que até então Euzinha tinha na conta de esperto e até inteligente, é apenas um exemplo. Quando questionei, devolveu com o descrédito, e disse que só acredita na própria mãe.
Não obstante, a pobre estava gripada no domingo. E com febre, mal se aguentando sobre as próprias pernas, porque fora contaminada pelo irmão do Tomé praieiro.
Mesmo assim, estava trabalhando, sob sol a pino, na praia onde sempre defendeu o pão: buchuda, amamentando, aguentando esporro de marido, que partiu cedo para o outro lado, depois de filho, cliente, credor, o diabo a quatro.
Pariu quatro ali, desde que a conheço, há 23 anos, batendo areia. Agora está botando a moçada pra jambrar, como diria minha mãe. Porque é obrigada a reduzir a exposição ao sol aos fins de semana, ou não vai se curar de um câncer de pele, na face que o filho cospe.
Nos dias dito úteis, faz faxina para garantir algum. Só que doente, não pode ir a lugar algum.
Vidinha mais ou menos. Como o é a vida da maioria das Marias e dos Zés Povinho neste país, que já foi terra de Deus e, agora, está entregue ao Capiroto Genocida. É desmonte e desgraceira por todo o lado: o sujeito só fala, e faz, merda.
Mas o que é dele está guardado. Não nos desesperancemos.
Fico por aqui. Obrigada pela companhia.
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Fontes requisitadas:
Mais de 20 milhões passam fome no Brasil e favelas dobraram em 10 anos