por Sulamita Esteliam
O assédio sangra a alma.
O abuso violenta
mente, corpo e coração.
O silêncio oprime.
O poder constrange.
A omissão envergonha.
A denúncia esclarece.
O grito liberta.
(Assédio e poder – SE)
Para fechar o mês da mulher, um caso de assédio sexual em escola pública no centro do Recife veio à tona pelas redes sociais e via protesto em frente ao colégio onde alunas-vítimas teriam sido constrangidas pela direção a não levar a denúncia adiante.
A história está descrita em reportagem do Marco Zero Conteúdo, públicada no dia 28 de março, que transcrevo:
Estudantes paralisam escola no centro do Recife em protesto contra assédio sexual
por Inácio França – no MZ Conteúdo
No dia 15 de março, estudantes e docentes da Escola de Referência em Ensino Médio Sizenando Silveira, na rua do Hospício, centro do Recife, participaram do encerramento de um projeto pedagógico chamado Respeita as Minas, com apresentação da cirandeira Lia de Itamaracá e da sambista Karynna Spinelli. Durante a realização do projeto não faltaram debates sobre machismo e o lugar da mulher na sociedade. Dez dias depois, o clima era absolutamente diferente.
Pelo menos uma centena de estudantes fecharam por alguns momentos o cruzamento e formaram uma corrente humana diante dos portões do colégio para protestar contra a impunidade de professores e funcionários que, recorrentemente, estariam importunando e assediando sexualmente as alunas, em sua maioria adolescentes com menos de 18 anos. Os casos de assédio sexual não seriam novidade na escola, mas o silêncio só foi rompido após a criação de um perfil anônimo no instagram, que logo recebeu na seção de comentários dezenas de denúncias diferentes, algumas se referindo ao ano de 2015.
A gota d’água para a criação do perfil teria ocorrido logo depois das atividades do projeto com abordagem feminista mencionado na abertura deste texto. Um professor de matemática teriam abordado duas alunas e perguntado se elas costumavam “fazer programa”, pois ele estaria interessado. Assustadas, as adolescentes reagiram imediatamente e denunciaram o assediador à direção da escola.
Foi a reação da diretoria que provocou a fúria dos estudantes. De acordo com as denúncias publicadas no perfil e confirmadas por estudantes com quem a equipe da Marco Zero manteve contato durante o protesto, diretores e coordenadoras da Sizenando Silveira teriam pressionado as meninas a não levar o caso adiante. Não deu certo, a notícia espalhou-se pelos corredores e, logo depois, o caso estava sendo comentado nas redes sociais.
Na quarta-feira, 23 de março, dois dias após ser criado, o perfil já contava com 1.620 seguidores. Boa parte dos comentários mencionavam a prática de “abafar” as denúncias e intimidar estudantes que cobravam punição. Das redes sociais, para o protesto diante da escola, bastaram mais 48 horas, contando com a participação de algumas mães de alunos, de representantes da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes) e até de integrantes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Pernambuco (Sintepe).

Recebimento das denúncias
Uma das mães presentes era Michelle Santos, assessora jurídica da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, cujo filho é aluno do 3º ano da EREM Sizenando Silveira. Ela interviu quando o vice-diretor que se apresentou como Élber, foi até a grade e convocou alunos e alunas para uma reunião com a direção e gestores da Gerência Regional de Educação (GRE). Informada que só estudantes matriculados na EREM poderiam entrar, Michelle protestou: “São menores de idade, ninguém tem o direito de se reunir com eles sem o acompanhamento dos responsáveis”. Assim, acabaram participando da reunião a própria assessora jurídica, sindicalistas do Sintepe, uma integrante da Ubes e seis adolescentes.
De acordo com Michelle, durante a reunião, alunos e alunas “revelaram as dificuldades que encontram para estabelecer um diálogo com a gestão da escola e narraram algumas situações de abuso e assédio de que têm conhecimento e que também sofreram”. Ao final do encontro, a gestão da escola e a GRE se comprometeram a apurar as queixas e a criar um canal para recebimento de denúncias. Uma comissão de estudantes, acompanhados por um integrante da gestão, passariam nas salas de aula explicando o que foi acertado com a gestão da escola e a GRE.
Mesmo assim, a codeputada Carol Vergolino, do mandato das Juntas, que preside a comissão de Direitos Humanos da Alepe informou que pedirá uma audiência com o secretário de Educação para cobrar a apuração de todas as denúncias de assédio e questionar a passividade da direção da escola.
Na segunda-feira, 28 de março, o perfil do instagram foi desativado.
A Marco Zero procurou a assessoria de comunicação da Secretaria Estadual de Educação, na segunda-feira, 28, para saber se as denúncias foram formalizadas e se os gestores estavam acompanhando o caso. Eis a íntegra da nota de esclarecimento enviada:
“A Secretaria de Educação e Esportes do Estado (SEE) esclarece que a Escola de Referência em Ensino Médio (EREM) Sizenando Silveira, situada no Centro do Recife, convocou, na última semana, as famílias das estudantes envolvidas no suposto caso de assédio para uma reunião com o suposto autor, um professor, onde a situação foi esclarecida. A gestão da unidade de ensino registrou um boletim de ocorrência na quinta-feira (24), contra o perfil no Instagram por calúnia e difamação. O caso será investigado pela Polícia Civil de Pernambuco.”
Texto atualizado com informações da assessoria de comunicação da Secretaria de Educação às 11h09min de 29 de março de 2022
As imagens desta reportagem foram produzidas com apoio do Report for the World, uma iniciativa do The GroundTruth Project.