
por Sulamita Esteliam
Ainda impactada com o discurso do ex-presidente Lula para multidão em Curitiba. Depois de quatro horas e meia de depoimento ao juiz Moro, um Lula emocionado e agradecido contém a custo o choro num discurso conciso, mas, ao final, deixa que a alma corra solta, acalentada pelos gritos de “Lula, eu te amo”!
“Eu não seria digno do carinho que vocês estão tendo comigo, se eu tivesse algum culpa e estivesse falando aqui com vocês agora. (…) Se eu, algum dia tiver que mentir para vocês, eu preferia que um ônibus me atropele em qualquer rua desse país, porque eu jamais poderia mentir para pessoas como vocês, que há muito tempo depositam confiança e me segue.”
Recompondo-se, arremata em boa provocação:
“Eu estou vivo, e estou me preparando para voltar a ser candidato a presidente desse país. Eu nunca tive tanta vontade como eu tenho agora: vontade de fazer mais, vontade de fazer melhor, e provar pra vocês que, se a elite brasileira não tem competência para consertar esse país, um metalúrgico com quarto ano primário vai provar que é possível.”
Recua e avança, cauteloso, pois sabe, e o diz, que é acompanhado a cada suspiro.
Por isso, não quero afrontar ninguém. Sou um cidadão que respeita as leis, respeita a Constituição e respeita a Justiça. A única coisa que eu peço a eles é que me respeitem.”
É impressionante a energia e a resistência deste homem. Transcende a retórica, o carisma; uma energia que nasce do e retorna ao povo, num amálgama que desafia a insensibilidade e implode as muralhas da racionalização.
Já escrevi aqui neste blogue: ninguém fica imune à presença de Lula.
Mas é mais do que isso. Lula é o povo e o povo é Lula.
E, claro, o próprio Lula tem consciência do fenômeno desta interação, e brande aos céus a sua arma. Começa, após dois minutos de pausa aos fogueteiros “que também têm direito”:
“Eu não tenho tamanho para tamanha solidariedade. Jamais poderia imaginar que um ônibus pudesse sair do Acre, da Bahia, do Piaui, do Rio Grande do Norte, de todos os estados do país para vir até Curitiba.
Já participei de manifestações com 500 mil pessoas, de todo o tipo que se possa imaginar. Mas nenhuma como essa para dizer que vocês confiam em alguém que está sendo massacrado por acusações injustas.”
É daí que vem sua força, reconhece, agradecido.
“Se não fosse vocês, eu não suportaria o que eles estão fazendo comigo. Disse no depoimento que o Jornal Nacional, nos últimos 12 meses, publicou 18 horas de matérias negativas sobre mim, isso equivale a 12 partidas de futebol, na tentativa de que eu seja massacrado antes do dia em que eu seja julgado.
Eu disse para eles que, possivelmente, a minha relação com vocês é diferente da relação dos políticos com seu eleitor: é uma relação de projeto de país e por uma sociedade civilizada.”
Gostaria, mas não pude estar em Curitiba. Acompanhei pelas redes sociais e a cobertura da TVT, que esteve de plantão ao longo de todo o dia até as oito e meia da noite, no encerramento do ato público na Santos Andrade, a Praça da Democracia.
A multidão – 30 ou 50 mil pessoas? – permaneceu firme por cerca de nove horas; sob chuva fina e temperatura de 14 a 16 graus ao longo de todo o dia. Começou logo pela manhã, depois de inaugurado o Acampamento da Democracia, a coisa de 4 Km da praça bem no coração da cidade.
Enquanto as pessoas se juntavam no local, centenas de sem-terra marcharam desde o acampamento até o local da concentração, onde ocorreu ato público. Apesar de não terem podido dormir como gostariam e mereciam.
Noite alta, o acampamento foi açoitado por foguetório, que queimou barracas, assustou e machucou trabalhadores. É o jeito fascista de se manifestar, atacando as pessoas, na calada da noite.

Dilma desembarcou logo cedo, vinda de Porto Alegre; Lula veio de São Paulo, no meio da manhã. A base parlamentar petista em peso, mais alguns deputados da esquerda aliada e representantes dos movimentos sociais, como João Pedro Stédile, do MST, e Guilherme Boulos, do MTST; do presidente da CUT, Vagner Freitas, dentre outros sindicalistas.

E foi nos braços da militância aguerrida que Lula chegou à Justiça Federal para depor. O carro estacionou à meia distância, e o ex-presidente, cercado por sua gente, pegou a bandeira nacional e caminhou no meio do povo até a barreira policial postada a 150 metros do prédio onde seria ouvido.
O contraponto é simbólico: o juiz Moro e os procuradores da Força Tarefa chegaram escoltados. E os “apoiadores” da Lava Jato levaram até um pixuleco para a Morolândia, mas não passavam de duas dezenas de gatos pingados.
Eram 20 horas quando Lula e Dilma chegaram à Praça Santos Andrade. Anunciados por Beatriz Cerqueira, do Sindicato dos Professores e presidenta da CUT Minas Gerais, Dilma foi a primeira a falar.
Aclamada ao som de “volta, Dilma” e “Dilma eu te amo”, entoado alternadamente pela multidão, a presidenta legítima – afastada pela camarilha que tomou de assalto o Brasil – é rápida e vai direto ao ponto.
“Esse país não vai continuar por esse caminho de golpe atrás de golpe: o primeiro golpe foi meu impeachment; o segundo golpe, o teto dos gastos para a educação e pra saúde; agora conspiram para aprovar a mais grave mudança nas leis de proteção ao trabalho.
Nem na ditadura militar ousaram tirar o direito dos trabalhadores. Estão produzindo um retrocesso jamais visto na previdência daqueles que trabalharam a vida inteira.”
E enumera a razão do golpe para apontar como vencê-lo:
“Perderam a eleição por quatro vezes. Mas nós temos uma responsabilidade para com a democracia. A gente não pode deixar que o golpe prevaleça. Principalmente, quando eles se valem de meios injustos de perseguição contra Lula.
Perder a eleição não é vergonha, só o é para golpistas. Esta é uma cerimônia pela democracia. A força de vocês justifica toda a nossa luta. E é a força de vocês que vai derrotar o monstro da arbitrariedade e da injustiça.”
Lula tem razão. Haverá um momento na História em que se vai mostrar o tamanho da lambança que fizeram com a democracia no Brasil.
A sordidez da perseguição do presidente que tirou milhões da miséria, sem desrespeitar contratos, que socializou a entrada dos desvalidos na universidade, que recuperou a soberania, o respeito mundial e a autoestima do Brasil.
“Eu esperava que depois de dois anos de massacre, eles me mostrassem alguma escritura, documento, pagamento, alguma coisa que eu fiz para ter o tal apartamento que eles dizem que eu tenho. Eu citei o Vicentinho, mas ele não sabe disso: ‘o importante é o principal, o resto é secundário”, disse, em tom de mofa, e virando-se para o deputado presente no palco.
Vai haver um momento no futuro que se vai reconhecer a covardia, o espírito predatório, a hipocrisia e a desfaçatez, além do machismo e da misoginia que moveram a farsa do impedimento da primeira mulher presidenta do Brasil, como bem lembrou Beatriz Cerqueira.
O PT Senado compartilhou a íntegra do depoimento em sua página no Facebook. A Tal Mineira reproduz direto do Youtube. Confira:
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