por Sulamita Esteliam
Estou completamente descompensada por conta da noite mal dormida, revirando na cama em busca do sono que teimava em não me trazer paz.
Fiquei em estado de choque com o assassinato de Marielle Franco, vereadora pelo PSol no Rio de Janeiro, na noite passada. Uma execução, que levou também o motorista Anderson Gomes, com todas as características de um crime político.
Não tive forças para ir ao ato-homenagem a ela no Recife. Até agora, limitei-me a postar pequeno tributo nas redes sociais. Repito o que escrevi:
“Luz não se apaga, Mas impunidade não pode ser legado. É triste. É revoltante. É indigno uma mulher ser abatida por gritar em defesa de seu povo, do seu lugar, de seu país, enquanto governantes e seus adidos sugam suas veias, arrancam seu coração. “Marielle, presente!”
Atos políticos em homenagem-protestos se espalham pelas capitais do País, enquanto o corpo de Marielle é velado na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Aqui no Recife é em frente à sede da vereança, no Parque 13 de Maio. Em Belo Horizonte, na Praça da Estação. Em São Paulo, no vão livre do Masp.
Em Salvador, no Fórum Social Mundial. Em Brasília, Florianópolis, Belém do Patá, Porto Alegre, Natal, Curitiba, Juiz de Fora/MG e Campos dos Goitacazes/RJ. “MariellePresente!”
Nada vai trazer Marielle de volta, nem toda sua exuberante coragem, solidariedade e pertencimento. Mulher negra, mãe de uma moça de 18 anos, apesar de jovem – tinha 38 anos; filha da Maré, graduada na Universidade, feminista e militante dos direitos humanos.
Uma liderança emergente, como poucas que a sociedade custa a formar, e que, por isso,” passou a carregar um alvo nas costas”, nas palavras do meu marido, Júlio.
Mulheres morrem todos os dias, em todas as cidades do mundo, recordam-me as palavras da comandante maior do YPJ, em vídeo que A Tal Mineira postou no início da semana.
Marielle, triste e indignamente, tudo indica, foi executada, e a responsabilidade é do Estado, quaisquer que sejam seus assassinos.
Morreu por que incomodava. Morreu porque vinha denunciando os crimes policiais e integrava o Observatório da Intervenção militar em sua cidade, sendo relatora da Comissão a respeito na Câmara.
A charge do Latuff, que abre esta postagem, resume à perfeição. E como define Fernando Brito, no Tijolaço, baseado no Rio:
“Não é preciso ser um sherlock para saber de onde vieram os assassinos da vereadora e de seu motorista, é claro.
Muito menos para saber que o crime colocaria a intervenção na berlinda, perante o país e perante o mundo.
O assassinato não foi um episódio comum da criminalidade do Rio de Janeiro.
Foi um desafio que veio de dentro ou da periferia das estruturas policiais, há décadas o celeiro dos grupos de extermínio no Rio de Janeiro.”
O assassinato tem repercussão internacional, não só nas midias sociais, como na imprensa do mundo inteiro.
O partido espanhol Podemos pediu à Comissão Europeia que “condene” o assassinato da vereadora Marielle Franco e que as autoridades em Bruxelas suspendam as negociações comerciais para fechar um acordo de livre comércio entre a Europa e o Mercosul.
Rachel Dodge, procuradora-Geral da República, abriu procedimentos para federalizar as investigações do assassinato.
Em nota, a presidenta Dilma Rousseff, a legítima, se confessou “profundamente chocada, estarrecida e indignada”. Pediu a apuração das mortes de Marielle e Anderson, no rigor da lei e lamentou:
“Tristes dias para o país em que uma defensora dos direitos humanos é brutalmente assassinada. Ela lutava por tempos melhores, como todos nós que acreditamos no Brasil. Devemos persistir e resistir nesse caminho.”
“Abominável!” foi a palavra usada pelo ex-presidente Lula para classificar o crime. Lula falou em entrevista à Rádio Metrópole, em Salvador, aonde foi participar da Assembleia Mundial dosPovos, no Fórum Social Mundial 2018:
“Todos nós temos que protestar duramente e exigir que o governo do Rio de Janeiro e as Forças Armadas prestem contas à sociedade. Já que não podem devolver a vida de Marielle, devem mostrar os culpados pela chacina.”
Aqui, naturalmente, o homicídio, especialmente nas circunstâncias em que se deu, causa comoção. Sobretudo entre mulheres que carregam o sentido da sororidade, o peso e a responsabilidade de ser mulher e ativista das causas que valem à pena.
A exemplo de Marlla Teixeira da Silva, de Exu, no Sertão pernambucano, que marcou esta reles blogueira em postagem no Instagram.
Transcrevo, com permissão da autora. O título é por minha conta, retirado do texto:

‘Às muitas Marielles’
por Marlla Teixeira – no Instagram
– Mas, Marlla, porque você ficou assim? Você nem conhece a Marielle.
– É, eu não conhecia Marielle… Mas eu sou uma Marielle.
Não sou da favela, mas sou do interior.
Não sou preta, mas sou descendente de escravo, índio, ciganos, menos de europeu.
Não tenho brasão e sou DA SILVA.
Estou como funcionária pública, servidora do SUS.
Sou militante da cultura; trabalhei oito anos defendendo a descentralização e a universalização da cultura sertaneja.
Sou #MULHER igual Marielle.
Sou Pagu indignada no palanque…
Tenho VOZ, tenho coragem igual Marielle tinha.
Sim, eu me vi na pele dela.
Eu me vi morta junto de Marielle, porque quando matam uma mulher que tem coragem de colocar o dedo na ferida, matam tudo aquilo que ela representava.
Sabe por quê?
Por que o machismo mata todos os dias.
Mataram a Marielle por quê?
Dedico este texto a muitas Marielles: @laideemar, @marllystorres, @helenildamoreira, @fafasaraiva, @ianaclaudiamarques, @omariaselmade, @sulaesteliam, @anafreire131
e tantas outras.
Minha rosa é um punho cerrado.”
Marielle era uma mulher que conhecia exatamente o seu lugar: na luta por seu gênero, por sua gente, por seu país.
Força, coragem e consolo à filha, toda família e aos amigos de fé.
Descanse em paz, Marielle!
E que seu exemplo ilumine nossos caminhos.
O Brasil precisa de muitas Marielles, vivas, ativas e empoderadas.
PS: Fotos, prints e memes compartilhados em redes pelo zap-zap @Coalas Mineiras – Coalizão Feminista, @Pioneiros HD, dentre outras. O A Tal Mineira agradece.
Triste demais! Arrasada!