por Sulamita Esteliam
Descansar é o que traduz a última jornada de Ramon. Lutou bravamente contra o câncer de esôfago; três anos de batalha, sem perder a esperança. A primeira cirurgia bateu na trave. Veio a químio, a rádio, a debilitação acelerada, a recuperação da imunidade e nova tentativa cirúrgica, ano passado, quando recebeu uma prótese. O procedimento lhe permitiu tomar água de canudinho, a primeira vez em três anos.
“Pensei que estava melhorando…!”, comentou uma prima-irmã da primeira geração – já fomos 49 ou 50, na segunda leva, desde nossos avós. E estava. Melhorou para se despedir.
A própria mãe anteviu em vídeo enviado para ele, já no hospital; recebi da irmã Raquel, a mais velha dentre as irmãs:
“Estou impedida de vê-lo, meu filho, por causa dessa pandemia, e minha saúde não está lá essas coisas, também. Mas rezo sempre pela sua recuperação, pela Misericórdia Divina para você. Você é muito amado, meu filho querido.”
Claro que choro ao ver a gravação. Choro agora ao transcrever de memória um trecho. Choro pela dor da mãe, minha tia Maria da Glória, já tão sofrida, e que se segura na fé para acalmar sua dor.
Sei que as pessoas que a gente ama vivem para sempre em nossos corações e lembranças. Sei ou imagino, que ninguém vai de véspera. Mas nenhuma mãe merece chorar a perda física de uma cria. Ramon é o primeiro da minha tia caçula, que pariu nove, quatro homens. E é o segundo que se vai – o sétimo foi colhido ainda criancinha.
Não teve vida fácil, nunca tivemos. Mas sempre foi generoso, sabia partilhar cada conquista e, embora contido, não se negava à solidariedade.
Jamais vou me esquecer do suporte que você me deu quando desfiz meu primeiro casamento. Separei como casei, sem lenço, mas com documento – e, então, mais duas crias para chamar de minhas. Não sei o que faria não fosse sua prontidão. Sou eternamente grata.
Não posso chorar sua partida, Ramon querido. Só peço que tenha luz, que descanse em paz. Até um dia, quem sabe!
Em tempo:
A Tal Mineira 