12 de agosto e a memória da tristeza, covardia e indignidade

por Sulamita Esteliam

Esta quarta-feira, 12 de agosto, dia do sepultamento de dom Pedro Casaldáliga, bispo Emérito de São Félix do Araguaia, encantado no último dia 08, ganha reforço na memória das pessoas de boa-vontade como um dia de tristeza, indignidade e covardia.

Mais do que isso, mais um dia em que a casa-grande usa seu poder para esmagar brasileiros e brasileiras que lutam pelo direito à cidadania a quem, junto com os povos indígenas, o religioso dedicou sua vida.

Desde a madrugada deste dia, a Polícia Militar do governador Romeu Zema, mais a Justiça aliada de Minas Gerais promovem o despejo de 450 famílias de agricultores sem-terra, que construíram o Quilombo Campo Grande, no Sul de Minas, há mais de 20 anos.

A demolição começou pela Escola Popular Eduardo Galeano. Educação e comida saudável, cultivada em agroecologia é o “crime” praticado na ocupação que superou o rastro do desemprego, fome e abandono deixado pela antiga Usina Ariadnópolis, falida em 1996.

O despejo se dá em plena pandemia e decreto de calamidade pública, o que torna a ação criminosa. Além do mais, descumpre acordo feito em mesa e diálogo sobre o conflito, afirma o MST. Acordo que garantia a permanência das famílias no local, ao menos enquanto durar a necessidade de isolamento social.

No início da noite o governador Romeu Zema publicou no Twitter nota explicando que o governo pediu, mas a Justiça não atendeu o pedido de suspensão da reintegração de posse, “sob pena de descumprir o artigo 301 do Código Penal”.

O referido artigo trata de prisão em flagrante delito. Qual o delito? A pandemia, o despejo em plena calamidade pública, desalojando famílias inteiras, incluindo idosos e crianças? A destruição das lavouras?

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O acampamento tem 40 hectares de hortas, 60 mil árvores nativas e 60 mil árvores frutíferas, e produz oito toneladas de mel por ano.

As famílias seguem no local resistindo à ação de despejo. Um grupo de parlamentares federais encaminharam ofício ao governador de Minas, solicitando reunião por teleconferência para tentar suspender a execução da ordem.

É impressionante a insensibilidade das autoridades brasileiras – e Minas segue a cartilha – com a vida de seu povo.

A imagem do trator destruindo a horta é aterradora. Assim como é o desmantelamento da escola que educava crianças para uma vida melhor, baseada na solidariedade e na consciência cidadã.

Não bastasse a truculência, parece que escolheram a dedo a data: 12 de agosto se completam 27 anos do assassinato de Margarida Alves, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba. Foi executada na porta de sua casa.

Seu pecado: denunciar abusos e desrespeito aos direitos das trabalhadoras e trabalhadores rurais.

Desde o ano 2000, mulheres do campo, da floresta e das comunidades ribeirinhas tomam as ruas de Brasília para regar a semente da luta. Este ano a marcha foi inviabilizada pela Covid-19. Um ato virtual foi  transmitido pelas redes da Contag – Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares.

Assista ao vídeo

Dom Pedro Casaldáliga  foi sepultado na manhã desta quarta-feira no Cemitério Iny (Karajá), à beira do Rio Araguaia, como era seu desejo. Seu corpo agora habita o mesmo lugar onde descansam indígenas e trabalhadores sem-terra, explorados e, não raro, assassinados por grileiros de terras da região de São Félix do Araguaia, no Mato Grosso,  sua Macondo de coração.

Descanse em paz, dom Pedro Casaldáliga – Foto: divulgação

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Leia a íntegra dos textos-fontes das informações referidas acima:

Brasil de Fato

Acampameto do MST, em Minas é alvo de despejo em meio à pandemia

Corpo de Dom Pedro Casaldáliga é sepultado em São Félix do Araguaia (MT)

Vi o Mundo

Acampamento Quilombo: Deputados pedrem reunião urgente com Zema para tratar do despejo; ofício

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